SANQUIXOTENE DE LA PANÇA | O Ultra-Direitista

Paulo Sanchotene
Paulo Sanchotene
Paulo Roberto Tellechea Sanchotene é mestre em Direito pela UFRGS e possui um M.A. em Política pela Catholic University of America. Escreveu e apresentou trabalhos no Brasil e no exterior, sobre os pensamentos de Eric Voegelin, Russell Kirk, e Platão, sobre a história política americana, e sobre direito internacional. É casado e pai de dois filhos. Atualmente, mora no interior do Rio Grande do Sul, na fronteira entre a civilização e a Argentina, onde administra a estância da família (Santo Antônio da Askatasuna).

“Quando Pedro fala de Paulo, diz mais de Pedro do que de Paulo.” (ditado popular)


No adjetivo “ultra-direitista”, há dois problemas: “ultra” e “direitista”. A coluna desta semana aborda o significado desses termos, usando o caso de Javier Milei, vencedor das primárias presidenciais argentinas e comumente tratado como sendo de “Ultra-Direita”.


A Bruna Torlay já escreveu sobre o assunto na semana passada, mas resolvi contribuir para o debate.

A imprensa nacional e internacional não perdeu tempo em tachar o candidato vencedor das primárias abertas, simultâneas, e obrigatórias (P.A.S.O.) da Argentina, Javier Milei, de “ultra-direitista”. Exemplos abundam, mas este vídeo ilustra bem a questão.

Na descrição, há dois problemas: “ultra” e “direita”.

“Direita” é um problema porque, apesar de ser de uso comum, o termo não tem um significado específico. A Direita é compatível com diversos pensamentos e pessoas; tão díspares quanto são Paulo Kogos, Damares Alves, Carlos Alberto Santos Cruz, Tarcísio de Freitas, Sérgio Moro, e Eduardo Leite – para citar apenas poucos exemplos.

Sim, pode-se argumentar que alguns desses nomes sejam “Direita Trans” – pessoas que apenas se identificam como Direita. Porém, em política, muitas vezes isso basta. Para piorar, a Esquerda padece de problema semelhante.

O relevante aqui é que chamar o Milei de “Direita” não informa coisa alguma por si.

Todavia, não apenas o chamam de “Direita”, como ainda acrescentam um prefixo: “ultra”. Para essas pessoas, Milei não é só de Direita, mas MUITO de Direita.

Pois caímos na questão de como alguém pode ser MUITO de algo que sequer conseguimos definir o que seja.

Para resolver isso, precisamos entender a função do “ultra” (frise-se, é a mesma do “extrema”). Trata-se de um alerta. Quem usa “ultra” para qualificar alguém politicamente quer passar a mensagem de que a pessoa referida tem posições exageradas, que fugiriam do limite do aceitável.

Portanto, a definição de Direita não é tão relevante. O “ultra” já nos informa o necessário: o tipo referido é perigoso. Ao menos, o é segundo as pessoas que assim o qualificam.

Quem recebe a mensagem não precisa acolhê-la sem questionamentos. É possível decidir se a aceita, se a recusa, ou se deixa o julgamento de tal opinião em suspenso até ficar mais bem informado.

Eu, pessoalmente, desconfio desse tipo de adjetivação. Afinal de contas, desde que me tornei cidadão brasileiro por completo há 25 anos, minha posição política está fora do consenso. Para quem está dentro, sou “ultra-direitista”.

Eu não sei qual é o consenso na Argentina, mas desconfio não ser muito distinto do nosso.

Milei pode ser perigoso? Em princípio, até pode. Porém, quando o consenso é mal feito, deixa-se de fora muitas pessoas e opiniões que enriqueceriam o debate público e que teriam a capacidade de fortalecer à comunidade política. Pode ser o caso do Milei.

O perigo pode não estar no Milei, mas justamente em quem o julga como “ultra-direitista”.

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