ISRAEL SIMÕES | 35

Israel Simões
Israel Simões
Terapeuta, filósofo clínico e curioso observador da vida cotidiana.

Trinta e cinco anos. Completei ontem, dia do meu aniversário. Agora estou, oficialmente, mais perto dos quarenta do que dos trinta. Aos poucos vou deixando o hall de entrada da vida adulta e me instalando na sala de estar, aquele lugar onde expressamos nossas opiniões com convicção, portamo-nos com mais naturalidade e selecionamos, sem hesitações, quem de fato participará da nossa intimidade. Hoje eu sou mais Eu do que os meus antepassados, mais presente do que memórias e mais “por gentileza, não me encha o saco”. 

Aquela desaceleração que sentimos aos 30, quando o corpo dá sinais de não ter a mesma disposição juvenil, agora encontra resistência. Com 35 estamos mais maduros para fazer sacrifícios como dietas, treinos e novos esforços intelectuais. É um renovo de forças e de engajamento, porque ninguém quer chegar aos 40 frustrado.

Em outras palavras: o que a vida não te deu até os 30, o que você não conquistou aos 35, corra para alcançar antes de virar a década.

Mas há quem chegue neste momento vivendo o oposto: uma certa paralisia. Por diversas vezes recebi, em meu consultório, pessoas entre 35 e 38 anos que não estavam satisfeitas com o lugar para onde suas escolhas as levaram, mas que também não sabiam que rumo tomar. Não se trata exatamente de uma crise, mas do medo de vive-la em breve. Experimentam este entressafra com ansiedade, agitação e muito falatório. Os encontros com amigos viram um misto de festa e sessão terapêutica, cada vez mais regados por álcool e distrações. É quando alguns começam a ser vistos como infantis pelo meio.

Cinco anos antes, a crise dos 30 é vivida como um dilema essencialmente social, quando o indivíduo quer sentir que cumpre o que dele é esperado, que os papéis que lhe cabem foram assumidos com responsabilidade, conferindo-lhe respeitabilidade e boa reputação. Já aos 40 experimentamos uma crise mais abrangente, de caráter existencial. Quando a energia física começa a declinar de fato, o desenvolvimento que era natural deve dar lugar à iniciativa pessoal, levando o sujeito a um necessário julgamento da vida em sua totalidade: o que se passou, o que foi realizado e o vislumbre do que deverá ser conquistado com urgência.

Quem souber virar os 35 avançando a marcha poderá salvar a jornada inteira; quem ceder às fraquezas estará, neste mesmo instante, dando os primeiros golpes de enxada na cova da vida que poderia ser e não foi.

Outras crises podem marcar a nossa trajetória: por volta dos 10 anos de idade, vivemos o conflito de ter que constatar se somos realmente felizes ou não, uma conclusão que decorre, diretamente, da percepção de amor dos pais. Aos 20 a crise é vocacional: é quando o jovem avalia se está conseguindo canalizar suas capacidades individuais em termos de uma atividade útil e rentável.

Aos 10, um olhar para trás; aos 20, um olhar para dentro; aos 30, para fora; aos 40, para frente. Entre passado e futuro, vida interior e comunitária, atravessamos tempo e espaço passando por crises disruptivas e movimentos de integração, cumprindo etapas que abrem e fecham o círculo da personalidade em um quadro cada vez mais definido, completo e acabado.

Para uma geração que busca a felicidade nas cápsulas, comprimidos, óleos essenciais e afirmações positivas, falar de crises é obrigatório. A aceitação destes estados de dúvida e de instabilidade é que faz nascer o projeto de uma vida bem erigida.

Uma edificação…que por aqui completou seus 35 anos com colunas fortes, algumas rachaduras e muito tijolo para assentar.

Porque só usufrui da casa pronta quem tolera o caos da obra.

E pequenas reformas, diárias.

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