FILOSOFIA INTEGRAL | Censura e inteligência

Quais os limites da liberdade de pensamento e de expressão? Minha convicção é de que eles devem ser estendidos ao máximo. Eu sei que, nisso, há riscos e perigos e, muitas vezes, abusos. Porém, aceitar que a liberdade precisa ser privilegiada significa mais do que proteger o direito do indivíduo, mas assegurar a possibilidade do desenvolvimento de sua inteligência.

Há aqueles que acreditam que a censura é necessária para que direitos alheios não sejam feridos. Com isso, defendem que certas palavras, expressões e ideias sejam suprimidas. Esperam, assim, que a proibição de sua veiculação as impeça de causar os males que lhes seriam próprios.

De certa forma, a censura sempre existiu e, em geral, ela nunca foi um problema para a inteligência. Historicamente, foram os poderes estabelecidos que a impuseram e aqueles que a sofreram souberem usar de criatividade e esperteza para driblá-la. Inclusive, foram em períodos de forte repressão à opinião que grandes artistas e intelectuais foram revelados.

O problema começa quando a censura deixa de ser governamental para ser social. Neste caso, forma-se uma rede de fiscalização que ultrapassa à burocracia oficial e passa a ser exercida pela própria população. Impõe-se, então, proibições que já não dependem de leis, nem de poderes. A própria sociedade, por meio de seus mecanismos super-eficientes de controle, cerceia o pensamento dos indivíduos.

As pessoas, então, intimidadas com pressão tão grande, começam a autocensurar-se, policiando-se a fim de não cometerem o erro de falar algo que possa ferir suscetibilidades alheias. Para isso, eliminam de suas manifestações, mas também de seu universo de consciência, toda uma gama de ideias que consideram agressivas. Ideias que, para elas, passam a ser vistas como pecados mortais, com os quais não se deve sequer flertar. Com isso, não apenas diminuem a possibilidade do que podem pensar, mas vivem temerosas de falarem ou pensarem algo que não deveriam.

Ao sucumbir ante às proibições, a inteligência para de se desenvolver. Isso é óbvio, já que, para tanto, ela necessita de liberdade, se não de expressão, ao menos de pensamento. Se, porém, ela não pode explorar todas as possibilidades, porque do universo mental foram eliminados diversos elementos, fica impossibilitada de progredir. A burrice torna-se o efeito imediato.

A verdade é que a inteligência, para aperfeiçoar-se, precisa sair do lugar-comum, arriscando-se em territórios inexplorados e perigosos. Desse jogo de tentativa e erro, de insinuações e provocações, de mergulhos constantes no desconhecido é que ela se alimenta. E nesse movimento a inteligência precisa ter a coragem de aproximar-se de pensamentos que podem ser socialmente reprováveis e que incomodam alguns tipos de pessoas.Todos os grandes artistas e pensadores foram pessoas que arriscaram ir além do senso comum, ousaram pensar o inusitado, tocaram em assuntos delicados, experimentaram raciocinar fora dos padrões, permitiram-se trabalhar com ideias perigosas e forçaram os limites estabelecidos. Gênios apenas o foram porque se negaram a ajustar sua imaginação aos moldes impostos pela sociedade.

Quando, porém, a inteligência restringe-se, proibindo a si mesma de ir além do que é socialmente permitido, perde sua elasticidade, atrofiando-se. Por isso, a censura social é tão perniciosa. Ela não apenas impede a manifestação do pensamento, mas estagna o raciocínio, murchando a criatividade, desanimando o conhecimento e sufocando qualquer tentativa de sua expansão.

Onde vence a censura, quem sucumbe é a lucidez.

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