VITOR MARCOLIN | Titan e Titanic

Vitor Marcolin
Vitor Marcolin
Ganhador do Prêmio de Incentivo à Publicação Literária -- Antologia 200 Anos de Independência (2022). Nesta coluna, caro leitor, você encontrará contos, crônicas, resenhas e ensaios sobre as minhas leituras da vida e de alguns livros. Escrevo sobre literatura, crítica literária, história e filosofia. Decidi, a fim de me diferenciar das outras colunas que pululam pelos rincões da Internet, ser sincero a ponto de escrever com o coração na mão. Acredito que a responsabilidade do Eu Substancial diante de Deus seja o norte do escritor sincero. Fiz desta realidade uma meta de vida. Convido-o a me acompanhar, sigamos juntos.

A mídia e o centenário mercado de manchetes

Na manhã do dia 15 de abril de 1912, a mídia de todo o mundo despertou com muito trabalho a ser feito: o Titanic havia naufragado levando consigo 1500 almas, os jornais, portanto, tinham muito assunto para vender. Em A nigth to remember (melhor traduzido para o português como Uma noite fatídica), Walter Lord, competente jornalista que, nos idos de 1950, entrevistou todos os sobreviventes do naufrágio de 1912, conta que o Titanic foi um divisor de águas para a imprensa. Isso porque a tragédia no Atlântico Norte deu aos jornalistas os principais elementos da manchete perfeita.  

Artistas, magnatas, figuras de destaque da alta sociedade do mundo inglês — o transatlântico zarpara do porto de Southampton, na Inglaterra, tendo como destino o porto de Nova Iorque — gozavam do melhor que os serviços da primeira classe poderiam oferecer. Subitamente, no entanto, como o despertar ao som de trovões numa noite de tempestade, o sonho transmuta-se no mais terrível pesadelo: o navio colide contra um iceberg, faz água e lentamente submerge nas gélidas águas do Atlântico. Não é preciso ter imaginação assaz oxigenada para deduzir as manchetes estampadas nos principais jornais do mundo…  

Enquanto escrevo isto, redatores de todos os veículos de imprensa do planeta lutam para escrever as mais criativas manchetes, porque o Titanic voltou a render. O navio naufragado há 111 anos atrai novamente a atenção de jornalistas, redatores e, sobretudo, editores. Mas há uma ligeira modificação na história desta vez: um grupo de bilionários que pagou os olhos da cara (US$ 250 mil) a fim de embarcar numa viagem a bordo de um submersível chamado Titan para conhecer o sítio arqueológico no qual jazem os destroços do famoso transatlântico perdeu-se, ao que parece, para sempre nas profundezas do oceano. Dentre os ricos infelizes está, inclusive, um magnata paquistanês que tem laços com a família real britânica; ele desembolsou US$ 500 mil em duas passagens para ter a companhia de seu filho de 19 anos durante a extraordinária visita ao Titanic.  

Sem querer fazer um trocadilho infame, o custo das passagens não deu direito à primeira classe aos pagantes. Não. Infelizmente. Todos a bordo estão igualitariamente presos no submersível a respirar os últimos metros cúbicos do oxigênio disponível, enquanto profissionais públicos e privados fazem das tripas coração a fim de localizá-los no fundo do oceano. Novamente a mídia explora os velhos temas que fascinam os leitores de jornais — impressos ou digitais — desde os primórdios do mercado de manchetes… Li há pouco que amanhã, pela manhã, a reserva de ar no submersível terá chegado ao fim. Tristíssimo! Que Deus os ajude. Há aqueles que, intoxicados pela velha mentalidade revolucionária, são capazes de sentir — e esbanjar — alegria, satisfação com a desgraça dos coitados presos no submersível Titan. É como se o dinheiro que eles têm os fizessem menos humanos, menos dignos da empatia e do amor do próximo. Só um louco pensaria assim.

“Se eu tomar as asas da aurora, para habitar nas extremidades do mar, também ali me alcançará tua mão, e a tua direita me segurará”.

Salmos 139. V. 9

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