VITOR MARCOLIN | Nobres políticos

Vitor Marcolin
Vitor Marcolin
Ganhador do Prêmio de Incentivo à Publicação Literária -- Antologia 200 Anos de Independência (2022). Nesta coluna, caro leitor, você encontrará contos, crônicas, resenhas e ensaios sobre as minhas leituras da vida e de alguns livros. Escrevo sobre literatura, crítica literária, história e filosofia. Decidi, a fim de me diferenciar das outras colunas que pululam pelos rincões da Internet, ser sincero a ponto de escrever com o coração na mão. Acredito que a responsabilidade do Eu Substancial diante de Deus seja o norte do escritor sincero. Fiz desta realidade uma meta de vida. Convido-o a me acompanhar, sigamos juntos.

O Brasil já teve políticos com vergonha na cara

A julgar somente pelo teor das discussões sobre política hoje, o leitor dificilmente poderia imaginar que o nível moral e intelectual dos políticos profissionais já foi outro. É normal. Hoje, sob o império da sem-vergonhice, do “toma lá, dá cá”, dos conchavos para compra de votos, das sessões feitas às pressas na calada da noite, dos discursos demagógicos a fim de inflar a bandeira do partido e de tantas outras infâmias mais, o eleitor médio já não tem imaginação para conceber uma realidade diversa do cenário político nacional. Mas não precisa ser assim. Houve um período da nossa história no qual nos orgulhávamos da “classe” política — pelo menos não tínhamos vergonha dela.  

Talvez não seja consenso entre os historiadores – e nem precisa ser –, mas a partir da Regência, período que sucedeu à abdicação de D. Pedro I, teve início no país a consolidação de um estamento político exemplar – mormente para a nossa época. Mas não só. Não é exagero dizer que a consolidação, a formação do germe político brasileiro naquele período foi também providencial. Sim, porque nós saíamos do Primeiro Reinado sob a ameaça caudilha: a fragmentação político-social refletida na fragmentação territorial da nação.  

Ameaça que, apesar de assustadora, não passou daí, pois o Brasil não se fragmentou. No seu “O Império Brasileiro” (1927), Oliveira Lima, exemplo de verdadeira militância intelectual que urge voltar a ensinar os nossos políticos muitíssimo mal-educados como um homem público deve se comportar, diz que a atuação dos Regentes, representados sobretudo na figura do Padre Feijó, foi determinante para a manutenção da coesão política, social e, claro, territorial do nascente Império do Brasil. Sucede que, como explica Oliveira Lima, aqueles estadistas nutriam um profundo desinteresse pelas possíveis benesses que a vida pública poderia lhes dar. O leitor leu corretamente: desinteresse. Eis o principal elemento ético que caracterizou o político brasileiro na Regência, no Primeiro e Segundo Reinados, na República Velha e, pasmem, durante as duas “ditaduras” que aqui tivemos, Getúlio e os militares de 1964.  

Não faço aqui uma romantização monarquista da nossa história. Não. Aqueles que se ocupavam de questões “sociais”, econômicas ou religiosas, quando subiam à tribuna – ou escreviam nos jornais — levavam consigo uma boa dose de vergonha na cara. Na imprensa ou no palanque os discursos de homens como José Bonifácio, Padre Diogo Feijó, Bernardo Pereira de Vasconcelos, Marquês de Olinda, Visconde de Ouro Preto, Joaquim Nabuco ou mesmo Rui Barbosa deixavam evidentes que o propósito do orador – ou do colunista – era o de ajudar a fazer o bem do Brasil. Mutatis mutandis, podemos acusá-los, e não sem razão, de uma série dos eternos pecados políticos que assolam o Ocidente desde a Grécia Antiga, mas não podemos chamá-los de ineficientes quando o assunto é o resultado positivo do trabalho público.

***

“Eu proporia que se substituíssem todos os capítulos da Constituição por: artigo único — todo brasileiro fica obrigado a ter vergonha na cara”.

Capistrano de Abreu

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