FILOSOFIA INTEGRAL丨A diferença entre informação e instrução

O senso comum exalta os colecionadores de dados, e estes existem em todas as áreas do saber humano. São cientistas, historiadores, juristas, médicos e tantos outros que desfilam exibindo uma coleção de informações que colheram e recolheram durante suas vidas. Todavia, em muitos deles, falta o mais importante: o senso de sentido. Sabem relatar fenômenos, citar datas, descrever processos, narrar fatos, mas são incapazes de dizer o que tudo isso significa; não conseguem extrair de toda a informação que possuem alguma significação.

Porém, para eles, não importa nada disso. Sua capacidade de obter e reter essas informações lhes é suficiente para angariar o reconhecimento desejado. São bem pagos, inclusive, para compartilhá-las com o público. Contra estes Schopenhauer, com seu jeito acidamente crítico, em seu livro ‘A arte de escrever’, mostra-se bastante incomodado. Ele critica-os por perceber que “não se esforçam pela sabedoria, mas pelo crédito que ganham dando a impressão de possui-la“; censura-os porque “não aprendem para ganhar conhecimento e se instruir, mas para poder tagarelar e ganhar ares de importantes”.

Apesar dele ter escrito isso há cerca de duzentos anos, o que o pensador alemão diz é muito atual. No meio intelectual, é comum gabar-se de ter lido tantos e quantos livros, geralmente numa quantidade impossível de ser abarcada por uma vida humana. São como Don Juans das letras, envaidecendo-se por ter-se deitado com páginas sem fim. Tudo por puro fetiche estético; tudo por puro esnobismo.

Também fazem ares de sabedoria só porque são capazes de citar de cor algumas quantidades consideráveis de dados. Aliás, há um verdadeiro culto destes, uma veneração das datas, dos nomes, das referências, dos números que tem feito desta geração arrogante e superficial. Como diz Schpenhauer, forjam pessoas que “não sabem nada e agora devoram os resultados do saber humano acumulado durante milênios, de modo sumário e apressado“, que se acreditam superiores pelo simples fato de “terem informações sobre tudo, sobre todas as pedras, ou plantas, ou batalhas, ou experiências, sobre o resumo e o conjunto de todos os livros“.

Schopenhauer realmente tinha aversão a esse tipo de erudição que tem “em mira apenas a informação, não a instrução“. Para ele, “informação é mero meio para a instrução, tendo pouco ou nenhum valor por si mesma“. Por isso, dizia que quem apenas lê, mas não reflete sobre o que lê, é como alguém que usa peruca, embelezando a cabeça com cabelos que não os seus.

O filósofo alemão tinha convicção de que é preciso reservar um espaço para a reflexão daquilo que se leu. Para ele, isto faz o conhecimento. Tanto que até caçoa de quem, segundo ele, “deve ter pensado muito pouco para poder ter lido tanto“, deixando claro que o acúmulo de letras não faz o pensador, inclusive desacostumando-o “da clareza e profundidade do saber e da compreensão“.

A verdade é que um pensador precisa ter tempo para pensar, meditar, refletir sobre os conteúdos que leu para, assim, poder chegar às suas próprias conclusões. Não pode viver apenas de uma leitura atrás da outra, de uma pesquisa atrás da outra. Não existe verdadeiro sábio que apenas recolhe dados obsessivamente e a única coisa que faz com eles é repeti-los como papagaios.

Schopenhauer se incomodava tanto com os eruditos falastrões que chegava a afirmar que “só chegará a elaborar novas e grandes concepções fundamentais aquele que tenha suas próprias idéias como objetivo direto de seus estudos, sem se importar com as idéias dos outros“. Um exagero, de fato. No entanto, num ponto ele está certíssimo: um verdadeiro filósofo estuda para poder pensar por si mesmo, para fazer suas próprias sínteses e chegar a uma compreensão que seja especialmente sua da existência.

A informação é útil para todo pensador. Mais ainda: é necessária, pois ela é a matéria sobre a qual ele trabalha. Porém, ele apenas poderá ser considerado verdadeiramente instruído se todos esses dados que possui lhe servirem para algo mais do que serem acumulados obstinadamente e ostentados publicamente, mas para ajudarem-no a alcançar as sínteses que lhe fornecerão o verdadeiro sentido de tudo.

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