VITOR MARCOLIN | Fraternité

Vitor Marcolin
Vitor Marcolin
Ganhador do Prêmio de Incentivo à Publicação Literária -- Antologia 200 Anos de Independência (2022). Nesta coluna, caro leitor, você encontrará contos, crônicas, resenhas e ensaios sobre as minhas leituras da vida e de alguns livros. Escrevo sobre literatura, crítica literária, história e filosofia. Decidi, a fim de me diferenciar das outras colunas que pululam pelos rincões da Internet, ser sincero a ponto de escrever com o coração na mão. Acredito que a responsabilidade do Eu Substancial diante de Deus seja o norte do escritor sincero. Fiz desta realidade uma meta de vida. Convido-o a me acompanhar, sigamos juntos.

Por que a máxima revolucionária parece tão esquecida? 

Das campanhas publicitárias produzidas ao longo de toda a História talvez nenhuma tenha tido tamanho impacto quanto o lema da Revolução Francesa: Liberté, Egalité, Fraternité. Mas que não haja confusão: “campanha publicitária” sim, mas de um conjunto de mercadorias impalpáveis, as ideias revolucionárias. E o povo comprou, a granel, aos montes, generosamente; tudo a preço de custo. Aparentemente, no entanto, uma delas passou despercebida, malbarateada: a Fraternidade. Pouco se fala sobre ela, tanto que o lema revolucionário caiu no esquecimento, ofuscado pelo brilho obsceno da Liberdade e da Igualdade.

Observemos, leitor, em nosso cotidiano, na escola, no trabalho, na faculdade, na mídia, na cultura, na tevê, na internet e… até na Igreja (pois eu já vi), todos gritam, esbravejam a plenos pulmões: “Liberdade!” “Igualdade!”. Mas ninguém milita realmente em prol da Fraternidade. E por quê? Vejamos alguns dos seus sinônimos a fim de encontrarmos uma resposta convincente: irmandade, afinidade, amizade, atração, inclinação, irmanação, vínculo, simpatia, afeto, identidade… amor. Percebe? Os elementos que implicam a Fraternidade demandam consenso. No âmbito social, leitor, as coisas devem ser de tal forma arranjadas de maneira que tudo esteja bom para mim e para você. E por que estaria bom só para você ou só para mim?

A Fraternidade caiu em desuso porque este elemento de reciprocidade inerente à sua realidade não serve às demandas revolucionárias, às necessidades de uma conjuntura na qual as relações sociais sejam determinadas por valores diversos daqueles estabelecidos via transcendente. Não é possível expor, num artigo, a coisa com maior clareza; talvez só numa narrativa ficcional, na qual a realidade não seja explicada, mas mostrada simplesmente. São os vínculos com o transcendente, os vínculos com a religião que dão o substrato das relações sociais genuínas. Você, caro leitor, não pode, genuinamente, jurar que fará o bem, que honrará as autoridades, que não roubará, não cobiçará, não assassinará quem quer que seja perante uma autoridade… estatal. Faltar-te-á, com a licença da mesóclise, convicção, sinceridade.

Um arrogante burocrata estatal, por força de um imperativo ontológico, jamais será autoridade suficiente para julgar a qualidade do amor ao próximo praticado por você, leitor atento. A força para organizar o caos vem da religião, como a História do nascimento e morte das grandes civilizações atesta. Aliás, a etimologia do termo traz em si a síntese de toda explicação: religar. Daí que o restabelecimento dos nossos vínculos com o transcendente seja tão diabolicamente combatido pela narrativa revolucionária. Mas não se iluda, respeitável leitor: Liberdade e Igualdade sem responsabilidade é a antessala do inferno, onde não pode haver nenhum resquício da incômoda Fraternidade. Daí que amar ao próximo como a si mesmo seja a mais reacionária de todas as decisões.

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