SANQUIXOTENE DE LA PANÇA | De Modelo à Toda Terra

Paulo Sanchotene
Paulo Sanchotene
Paulo Roberto Tellechea Sanchotene é mestre em Direito pela UFRGS e possui um M.A. em Política pela Catholic University of America. Escreveu e apresentou trabalhos no Brasil e no exterior, sobre os pensamentos de Eric Voegelin, Russell Kirk, e Platão, sobre a história política americana, e sobre direito internacional. É casado e pai de dois filhos. Atualmente, mora no interior do Rio Grande do Sul, na fronteira entre a civilização e a Argentina, onde administra a estância da família (Santo Antônio da Askatasuna).

Setembro é um mês cívico para os gaúchos, começando na Semana da Pátria em 1º de setembro e estendendo-se até a celebração da Revolução Farroupilha o dia 20 [passando pelos aniversários do meu casamento e do Grêmio].

É o mês em que nós gaúchos temos nossa gauchidade potencializada. Para quem não gosta de nós, é melhor evitar uma visita. Porém, já aviso, quem clicou inadvertidamente no linque desta coluna acabou por fazer-nos uma visita. Agora, aguenta!

Como a aurora precursora
Do farol da divindade
Foi o Vinte de Setembro
O precursor da liberdade

Mostremos valor, constância
Nesta ímpia e injusta guerra
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda Terra

Mas não basta pra ser livre
Ser forte, aguerrido e bravo
Povo que não tem virtude
Acaba por ser escravo

O hino rio-grandense é um hino revolucionário. Fala em liberdade, virtude, e façanhas. Há quem acuse a letra de falta de modéstia. Pior, há quem acuse a letra de racismo. Ambas as acusações são infundadas. Explico.

No trecho do hino rio-grandense em que se canta “povo que não tem virtude acaba por ser escravo”, qual seria o sentido de “virtude”? A resposta para essa pergunta é a chave para compreender o hino.

Para mim, tal ‘virtude’ no hino é no sentido de virtù maquiavélico; isto é, a capacidade de tomar as rédeas da própria vida e superar as dificuldades impostas pelas circunstâncias sem depender do auxílio da fortuna (sorte).

Como qualquer virtude, é preciso desenvolver e praticar virtù para não a perder. Assim, o hino faz referência à virtù PEDAGOGICAMENTE. Povo escravo não tem virtù, pois está privado de “tomar as rédeas da própria vida”. Porém, é possível adquirir virtù (superando “as dificuldades impostas pelas circunstâncias”) e preservá-la.

A condição de escravo referida no hino, portanto, não é obra do destino, mas uma circunstância histórica remediável pela realização da virtù pelo povo. O hino não fala de uma situação concreta específica, mas de uma possibilidade constante; de uma condição inescapável. Povos estão sujeitos à escravidão, mas é possível evitar ou livrar-se de tal mal.

Desse modo, a letra do hino gaúcho refere a toda e qualquer comunidade humana em todo e qualquer tempo e em todo e qualquer lugar. Por estarem tomados de virtù, os gaúchos servem “de modelo à toda a Terra”.

4 COMENTÁRIOS

    • Sim, Ângela. E dependendo de como entendemos nossa cultura, garra, e ideais, interpretamos o significado da letra. Muito da nossa opinião revela mais sobre nós do que sobre aquilo que opinamos.

  1. Excelente reflexão sobre o trecho do hino riograndense. Talvez possamos espraiar esse fundamento para acabar com a retórica de alguns vitimistas do século XXI

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