SANQUIXOTENE DE LA PANÇA | Feliz Páscoa

Paulo Sanchotene
Paulo Sanchotene
Paulo Roberto Tellechea Sanchotene é mestre em Direito pela UFRGS e possui um M.A. em Política pela Catholic University of America. Escreveu e apresentou trabalhos no Brasil e no exterior, sobre os pensamentos de Eric Voegelin, Russell Kirk, e Platão, sobre a história política americana, e sobre direito internacional. É casado e pai de dois filhos. Atualmente, mora no interior do Rio Grande do Sul, na fronteira entre a civilização e a Argentina, onde administra a estância da família (Santo Antônio da Askatasuna).

Pessoal provoca, e há sempre quem caia


Eu até iria escrever sobre outro tema, mas as colunas do Israel Simões sobre o ‘The Chosen’ e um tuíte da Bruna Torlay me fizeram mudar de ideia. ¿O que a Páscoa tem a ver com política? Nada e tudo. A salvação é individual, mas ninguém consegue sozinho. O estado cristão é laico. Eu matei Cristo, e Ele morreu para me salvar. Devemos amar os inimigos. É tudo paradoxal, mas é verdadeiro…


Terça-Feira, 3 de Segumbro de 524

Vem a Páscoa e o Natal, e, sem exceção, reemergem debates políticos sobre o significado dos feriados. Chegam a ser cansativos os debates estéreis, os quais invariavelmente fogem das reais questões sobre o problema.

Como exemplo, há um argumento que sempre me chama a atenção: pelo apreço à punitividade [e, reconheçamos, há exageros quanto a isso], caso Cristo hoje retornasse, a Direita seria responsável por crucificá-lo. Afinal, “bandido bom é bandido morto” [tema da  minha primeira coluna da Esmeril, aliás]. Sempre há quem morda a isca.

A Bruna Torlay expressou sua indignação quanto a tais debates num tuíte recente:

A discussão política entre nós é tão doente que chega ao ponto de contaminar a Páscoa. Quando se debate se Jesus era isso ou aquilo, com direito a réplica do adversário político, a religião já foi esquecida, ou posta em último plano. Por ambas as partes.
(TORLAY, Bruna. Twitter. 46 de Quaresma de 524)

Disso é possível ir-se a uma infinidade de assuntos. Restringerei esta coluna a dois.

Primeiro, há um lado bom nesse imbróglio: está-se falando de Deus no espaço público. Há quem diga que isso fere o princípio da separação entre Estado e Igreja. ¿Será?

Ademais, podemos aprender também como seria uma resposta propriamente cristã a esse tipo de provocação. ¿Como ser politicamente cristão?

[Isso vale também para os debates sobre as últimas colunas do Israel Simões; que tratam do ‘The Chosen’. Recomendo a leitura.]

A politização da fé não é nenhuma novidade. Diria até ser o comum. A quebra dessa unidade entre religião e política ocorre com o advento do Cristianismo. A tão falada “Separação entre Estado e Igreja” é uma criação cristã.

No mínimo quatro passagens bíblicas são muito claras quanto a isso: Cristo nega a oferta do Diabo para assumir todos os reinos do mundo (Mt 4:8-10; Lc 4:5-8); Jesus afirma: “O meu reino não é deste mundo” (Jo 18:36); e “Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” (Mt 22:21).

Contudo, a política não é revogada. Segue sendo necessário dar-se a César o que é de César – incluindo os impostos cobrados [compatíveis, portanto, com Ex 20:15; mas isso é outro assunto]. O cristão é cidadão de dois reinos: um, daqui e de agora; e outro, dalém e eterno. Isso torna tudo mais complicado.

Até hoje essa separação entre fé e política é fonte de problemas. Afinal, ¿o que é de César e o que é de Deus? Essa pergunta é sempre relevante em qualquer tempo e em qualquer lugar, mas é o Cristianismo quem a pôs em evidência.

A “Separação entre Estado e Igreja” não tem nada que ver com proibir manifestações públicas de fé, acabar com feriados religiosos, ou vetar falar-se de Deus no espaço público. Basicamente, essa é para:
– primeiro, evitar a tentação de usar a política para estabelecer o Paraíso na terra; e,
– segundo, preservar nossa liberdade em busca do Bem.
Em suma, é para nos impedir de dar a César o que é de Deus e a Deus o que é de César.

Para o cristão, o Reino não é deste mundo. Logo, a Salvação não se dá pela política.

Não será coletivamente que chegaremos à morada dos justos. Trilhar o Caminho é um esforço individual. Porém, para aprender a trilhá-Lo, dependemos da ajuda alheia. Não é algo inato ao homem. Não podemos segui-Lo sozinhos. Sabedores disso, vemo-nos obrigados a ajudar aos outros.

Mas, Paulo, tu disseste que o esforço é individual para, logo depois, afirmar ser coletivo.

Obrigado, leitores atentos. Disse isso mesmo. Somos todos Simão e Cristo no Calvário. Ninguém poderá fazer o Caminho por vós. Simão até carregou a Cruz, mas Cristo caminhou ao seu lado. Cristo não conseguiria sem a ajuda de Simão, mas teve de fazer sua parte. Devemos caminhar lado a lado, mas a Entrada é feita um por vez.

Não podemos terceirizar à comunidade nossa obrigação individual de amar a Deus, a nós mesmos, e ao próximo. (Mt 22:37-39) Não é na urna ou na defesa do “lado certo” que cumprimos nosso dever para com os outros.

Quando debatemos politicamente, ¿qual o objetivo?

Um debate, como qualquer conversa ou diálogo, estabelece uma relação. Precisamos estar cientes dessa relação. Ao fazermos parte de uma, condicionamos o nosso próprio crescimento pessoal a ela. A qualidade da relação nos torna melhores ou piores [e isso inclui a comunidade política].

Cristo ensina: “… Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus…” (Mt 5:44) Até para brigar com alguém é preciso ter caridade. Até para punir alguém é preciso ter caridade.

¿Por que brigo? ¿Por que puno? Se não for para restabelecer justiça, fazer bem ao outro, e restaurar comunidade, ¿qual seria a razão?

¿Sabeis quem seria responsável pela crucificação de Cristo caso Ele viesse hoje? Vós.

Já sois responsáveis. Nós somos responsáveis. Eu também. Não há nada de novo isso. Então, se alguém vos acusar dessa responsabilidade, basta concordardes. Cristo veio para tirar os pecados do mundo – de todos, inclusive os nossos.

Isso não nos dá salvo-conduto para ficar pecando. Isso tira o peso sobre nós causado pelos nossos próprios erros. Eu matei Cristo, mas Ele me salvou. De novo, e de novo, e de novo, e de novo… Porém, a cada realização desse fato, eu me torno uma pessoa melhor.

Errar faz parte. Aprende-se e segue-se adiante.


¡CRISTO ESTÁ VIVO! ¡ALEGRAI-VOS!
Até a próxima terça.

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