VITOR MARCOLIN | Vejam o verde-louro desta flâmula

Vitor Marcolin
Vitor Marcolin
Ganhador do Prêmio de Incentivo à Publicação Literária -- Antologia 200 Anos de Independência (2022). Nesta coluna, caro leitor, você encontrará contos, crônicas, resenhas e ensaios sobre as minhas leituras da vida e de alguns livros. Escrevo sobre literatura, crítica literária, história e filosofia. Decidi, a fim de me diferenciar das outras colunas que pululam pelos rincões da Internet, ser sincero a ponto de escrever com o coração na mão. Acredito que a responsabilidade do Eu Substancial diante de Deus seja o norte do escritor sincero. Fiz desta realidade uma meta de vida. Convido-o a me acompanhar, sigamos juntos.

Crônica de um Domingo de eleição

A verdade é que tive o ímpeto de ir à missa com a bandeira verde & amarela nas costas. Mas não. Contive-me. Em algumas paróquias antigas a flâmula símbolo da nação ficava a um canto do altar, em destaque. Mas tenho a impressão de que eram outros tempos. Neste Dia do Senhor eu teria a oportunidade de usufruir adequadamente da bandeira nacional. Ite, missa est

E lá estava ela vaidosamente a ocupar um lugar de destaque na sala de aula. Todos, homens e mulheres, faziam fila para vê-la e tocá-la; alguns, como eu testemunhei, até faziam o sinal da cruz ao deixá-la. Era a urna eletrônica que, guarnecida pela amurada de papelão da cabine de votação, reinava na minha antiga sala de aula. Que saudade tenho dos momentos que vivi naquela escola – um prédio razoavelmente belo construído nos anos 1970. As salas, os corredores, o refeitório, o pátio, a quadra poliesportiva, o laboratório de informática… a biblioteca… Ah!, aquela biblioteca…  

Gosto da tradição; aliás, acho que gostar não é o termo adequado, na medida em que possa exprimir tudo o que quero dizer. Eu amo a tradição, seja ela cultural, religiosa ou política. Pronto. Eu até posso apreender a tradição com os meus sentidos: o cheiro inebriante dos corredores e das salas de aula de minha antiga escola é um dado da realidade que me conecta à tradição. É sim. Pelo menos no tocante à vida de estudos que, mais tarde, revelar-se-ia como um estilo de vida próprio dos vocacionados… A cabine de votação, como dito, jaz em destaque na minha antiga sala de aula.  

Esta eleição, no entanto, apesar de manter, tradicionalmente, todos os elementos que perfazem a normatividade do meu Domingo eleitoral, está ligeiramente diferente. Inegavelmente há mais, muito mais flâmulas com as cores Bragança-Habsburgo nas ruas. Bandeiras de todos os tamanhos, camisetas, faixas, bandanas… vi até uma moça à moda indígena com dois riscos verde & amarelo sob os olhos. Mas a minha bandeira era enorme, de uma generosidade que contrastava até com o entusiasmo das ruas.  

À parte a evidente atmosfera de patriotismo – que jamais testemunhei numa eleição –, nada de especial aconteceu, exceto um detalhe no comportamento das pessoas que me viam com o lindo pendão da esperança sobre os ombros. Desde que saí de casa pude perceber que aqueles que passavam por mim, geralmente os homens, faziam um ligeiro movimento com a cabeça, uma espécie de assentimento à minha disposição patriótica. As mulheres esboçavam um sorriso. Creio que, se vivêssemos ainda na belle époque, os meus patrícios tirariam o chapéu para o moço alto com a bandeira nas costas. O que será que se passaria na missa se eu tivesse ido de verde & amarelo?  

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