SANTO CONTO | O Sim

Leônidas Pellegrini
Leônidas Pellegrini
Professor, escritor e revisor.

Baseado no Evangelho de São Lucas e nas visões da Bem-Aventurada Anna Catarina Emmerich

Entardecia quando Maria se despediu de José, que saía com dois jumentos para buscar as ferramentas que levaria à oficina no novo lar. Ficou olhando o esposo e os animais se afastarem até que sumissem no horizonte, depois passou pela mãe e as primas no jardim da casa e dirigiu-se a seu quarto, nos fundos. Retirou-se para trás de um biombo de vime, onde vestiu um longo manto de oração branco, feito de lã, e cobriu sua cabeça como um véu branco amarelado. Nesse meio tempo, uma criada entrara no quarto com uma lamparina e acendera um candelabro com vários braços, que estava pendurado no teto. Maria puxou para o centro do quarto uma mesinha baixa que estava encostada na parede, colocou sobre ela um pano vermelho e azul, e sobe ele um rolo de orações. Colocou diante de si uma pequena almofada, ajoelhou-se e pôs-se a orar, as mãos cruzadas sobre o peito e os olhos voltados para o céu.

Enquanto ela orava, uma serpente que havia entrado na casa e se arrastara sem ser percebida entrou no quarto. Enquanto a serpente a espreitava da porta, sem conseguir se aproximar, a jovem sentiu uma opressão no peito, uma angústia avassaladora, e intensificou suas orações. Clamava a Deus pela Redenção do mundo, pelo Rei prometido, e para que ela, ainda que em sua pequenez, pudesse de alguma forma contribuir para que Ele fosse enviado. Então, entrou em êxtase e curvou-se. Sobre seu lado direito incidiu um facho de luz vindo do alto, de onde flutuava o Arcanjo na forma de um jovem reluzente, a saudá-la:

Ave, cheia de graça! O Senhor é contigo!

Sem ousar olhar para cima, Maria inquietou-se com aquelas palavras, e pôs-se a conjecturar sobre o que elas significavam, quando o Anjo continuou:

Não tenhas medo, Maria, pois encontraste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o Trono de seu pai Davi; e Ele reinará eternamente na casa de Jacó.

Maria sentia-se confusa com aquela torrente de revelações. Seu coração acelerava. Perguntou ao Anjo:

Como pode ser isso possível, se não conheço homem algum?

O Anjo respondeu-lhe:

– O Espírito Santo descerá sobre ti, e a força do Altíssimo te envolverá com sua sombra. Por isso, o ente santo que nascer de ti será chamado Filho de Deus. Também Isabel, tua parenta, concebeu um filho na velhice; e já está no sexto mês aquela que era tida como estéril, porque a Deus não existe o impossível.

Então, disse Maria:

– Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo tua palavra.

O Anjo afastou-se. Naquele momento, a serpente pôde avançar, mas antes que conseguisse se aproximar da jovem, o Arcanjo esmagou-lhe a cabeça sob seu pé direito, e o animal revelou-se em forma monstruosa. Três outros Anjos adentraram o quarto e expulsaram a fera a socos e pontapés, e a arremessaram de volta às profundezas de onde viera enquanto o monstro gania e urrava, humilhado.

Sobre Maria, agora, incidiam três fachos de luz vindos do alto. Não havia mais teto no quarto, e a jovem levitava enquanto seu corpo se tornava cada vez mais luminoso e translúcido, sem qualquer vestígio de sombra. Na luz que irradiava dela revelavam-se inúmeras rosas brancas com folhas muito verdes. Também se revelavam nela Adão e Eva, prostrados em ação de graças (Eva chorava, mostrando-se especialmente grata), e toda a linhagem dos patriarcas, profetas, reis e juízes da Sacra História. Noé, Abraão, Jacó e seu filho José, Moisés, Enoque e Elias desatacavam-se entre eles. Figuraram no ventre da jovem as imagens das duas Arcas, com um arco-íris sobre elas, e então fixou-se ali a figura do Rei Davi, que rejuvenescia até tornar-se um bebê, luminoso e translúcido como Maria naquele momento. Então o bebê foi regredindo a um estado intrauterino, mês a mês, até se transformar numa gota de sangue ali no centro da jovem. E o quarto, que era todo luz, sem quaisquer divisórias, foi voltando ao seu estado ordinário.

Naquele momento, Anna e as primas de Maria chegavam ao quarto, atraídas por um barulho que não conseguiram distinguir. Da porta, viram-na ajoelhada, em transe, orando com as mãos sobre o ventre e os olhos voltados para o alto. Retiraram-se discretamente.


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