ISRAEL SIMÕES | Espadas e enxadas

Israel Simões
Israel Simões
Terapeuta, filósofo clínico e curioso observador da vida cotidiana.

Conta-nos o livro sagrado que, no ano 445 a.C., retornavam à cidade de Jerusalém os judeus que haviam sido escravos na Babilônia, debaixo do reinado de Nabucodonosor II. A antiga capital da nação judaica fora queimada e destruída pelos seus inimigos. Neemias era um judeu eunuco que servia no palácio de Artaxerxes I, rei da Pérsia. Quando ele soube da condição de Jerusalém, pediu ao rei que lhe permitisse retornar à cidade de seus pais para reconstruí-la. O rei consentiu.

Ao chegar em Jerusalém, Neemias reuniu os homens e os estimulou à empreitada de erguer os muros e as portas da cidade, para que pudessem, novamente, habitar naquele lugar. Mas o governante Sambalate, juntamente com seus oficiais, zombavam e desprezavam o projeto.

Neste momento levantaram-se os homens simples, os trabalhadores, os comerciantes, os músicos, os sacerdotes e as mulheres para dar início à construção. Isso mesmo: todos decidiram arregaçar as mangas, dos fortes aos frágeis, sem exceção.

Vendo Sambalate que o muro se erguia, reuniu um exército para derrubá-lo. De todos os lugares juntava homens para invadir Jerusalém e destruir a obra que os judeus haviam iniciado. Nesse tempo os construtores já estavam perdendo as suas forças, pois além do muro que erigiam, havia muito entulho para ser retirado das antigas ruínas.

Então Neemias armou as famílias que ali estavam, ordenou que vigiassem a cidade e que os construtores retomassem a obra. Cercados por uma numerosa milícia, na iminência de uma batalha, aqueles que reconstruíam o muro e os carregadores que transportavam as cargas faziam o seu trabalho com apenas uma das mãos.

A outra segurava a espada.

O testemunho é de que aqueles homens não trocavam sequer a roupa do corpo: de dia trabalhavam, à noite vigiavam. Houve ainda muitas ameaças e emboscadas de Sambalate e seus homens a fim de matar Neemias, mas ele orou a Deus e pediu: fortalece as minhas mãos!

E cinquenta e dois dias após sua chegada à Jerusalém, o muro estava erguido com as suas portas e trancas.

Que história! Com uma mão aqueles homens seguravam a pá, o martelo e o prumo; com a outra, a lança. Li este texto quando era jovem e a imagem dos braços duplamente ocupados se impregnou na minha mente: o guerreiro e o servo, o colérico e o fleumático, arquétipos antagônicos reunidos sob a urgência de uma bravura indômita.

Não se trata de força explosiva e juvenil, mas constante e inabalável, a mesma que move o pai de família, a mãe que labuta, o homem comum.

Portanto faço uma sugestão ao estimado leitor: para cada lema de Josemaría Escrivá (ou visão teológica de Kuyper, para os protestantes), anexe um estratagema do general Sun Tzu.

Se o trabalho cotidiano santifica o homem em seu caminho, a luta aguerrida, igualmente.

Carregar enxadas e espadas.

Esta é a nossa missão.

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