FILOSOFIA INTEGRAL | Enfadonhas Certezas Políticas

Outro dia, fui convidado a participar de um seminário sobre política. Depois das palestras, sempre há aquele momento que oradores e plateia se juntam para conversar mais pessoalmente. Não me furtei a isso. No entanto, confesso, não consegui ficar mais do que vinte minutos no local. No dia seguinte, foi bem diferente: encontrei-me com meus alunos, passei horas com eles e ficaria ainda mais. Qual era a diferença? Os participantes do seminário político tinham certeza de tudo, teoria sobre tudo, respostas exatas sobre as questões mais complicadas do mundo e as soluções para os problemas mais complexos da sociedade; enquanto isso, meus alunos tinham principalmente dúvidas.

Passei vinte anos da minha vida falando sobre política, escrevi um livro que envolve trata de um tema político, portanto, parece claro que meu problema não é com a política, em si mesma, mas com a maneira como as pessoas a abordam. Geralmente, quem fala de política faz isso com uma convicção inabalável. Porém, não há nada mais chato do que uma pessoa que não tem dúvidas. Para ela, não há espaço para aprendizado; apenas para os seus discursos prontos.

Ativistas políticos já escolheram um lado, filiaram-se a uma ideologia, possuem as respostas para todos os movimentos que acontecem no âmbito da disputa do poder. Não importa a complexidade da questão, nem a obscuridade da circunstância, tudo, na cabeça deles, está claro demais para ser questionado. Obviamente, uma conversa de cinco minutos com qualquer um deles é uma experiência enfadonha, pois não passa de um desfile de teorias e asseverações incontestáveis. Não é à toa que toda vez que troco algumas palavras com pessoas ligadas à política, tenho aquela sensação de frustração e perda de tempo.

Talvez seja um cacoete que adquiri estudando e ensinando filosofia por muito tempo, mas seja o assunto que for, e especialmente a política, costumo abordá-lo levantando mais perguntas do que afirmações. Com a Filosofia, a gente aprende sobre as dificuldades que existem na colheita dos dados da realidade e como é preferível, para quem busca o verdadeiro conhecimento, tomar as informações como temporárias e suspender os julgamentos, o máximo possível.

O problema é que nos meios envolvidos com política, demonstrar dúvida, ainda que meramente metódica, é visto como vacilo, isenção e descomprometimento ─ quando não como traição pura e simples. Neles, se a pessoa não tiver muito claro o que está ocorrendo no mundo, quem são os inimigos a se combater e os objetivos a se buscar, será vista como alguém que mais atrapalha do que ajuda.

A militância política é o exato oposto do que se espera de uma personalidade filosófica. Esta, apesar de buscar a verdade e perseguir a certeza, tem como princípio a dúvida e como primeira lição o mapeamento da própria ignorância. Uma mente filosófica compreende a complexidade do mundo e sabe que os acontecimentos estão sobrepostos. Por isso, ela entende que as primeiras impressões que se tem sobre o que acontece geralmente não refletem a verdadeira natureza das coisas nem a essência dos fenômenos.

A mente política, por outro lado, tem pressa porque cuida do que é imediato, daquilo que está ocorrendo agora. Também envolve-se no espaço das decisões e das consequências urgentes. Tudo isso faz com que ela costume achar que quem se dedica demais à reflexão seja um tipo de gente muito passiva. O que a mente política não entende, porém, é que se a filosofia propõe mais perguntas do que oferece respostas não é porque se delicia na dúvida, mas por querer encontrar uma verdade que seja inabalável, sabendo que, para isso, terá de rastrear os dados com muito cuidado e parcimônia..

Não é por acaso que as conversas com meus alunos de filosofia são mais prazerosas: inexiste neles aquela certeza meio arrogante de quem acha que pode entender o mundo com base em algumas informações confusas. Se forem estudiosos sérios, saberão sua posição no mundo e seu estado atual de conhecimento, ficando, assim, mais abertos ao aprendizado. Se as conversas com eles não trazem muitas certezas, são por isso mesmo muito mais frutíferas, pois não estão limitadas às convicções toscas de quem acha que sabe tudo só porque acompanha as notícias do dia.

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