DOSE DE FÉ | Santa Teresa de Ávila

Leônidas Pellegrini
Leônidas Pellegrini
Professor, escritor e revisor.

Reformadora do Carmelo, Santa Teresa de Ávila deixou como seu maior legado um exemplo de vida de oração que leva à perfeita comunhão com Deus

Hoje é dia de Santa Teresa de Ávila, ou Santa Teresa da Cruz, virgem, mística e Doutora da Igreja.

Nascida em Ávila, na Espanha, em 1515, Teresa Cepede e Anhumada recebeu educação esmerada. Devota desde pequena, acostumada com a leitura das vidas dos santos, chegou a tentar fugir de casa, quando criança, com intenção de evangelizar os mouros.

Aos 14 anos, Teresa ficou órfã de mãe, e seu pai a entregou para terminar sua educação com as Irmãs Agostinianas. Aos 20 anos, contra a vontade do pai, ingressou no Convento da Encarnação, Carmelo de Ávila, onde permaneceu por três anos, até adoecer gravemente e seu pai precisar tirá-la da Casa antes que professasse seus votos perpétuos.

O período que passou enferma foi grave e de grande sofrimento, mas fundamental para sua formação espiritual. Nesse tempo, foi-lhe dado de presente por parte de um tio um livro chamado Terceiro Abecedário Espiritual, do Padre Francisco de Osuna. Esta obra consiste de instruções para exames de consciência, para autoconcentração espiritual e contemplação interior. Também foi muito influenciada pela leitura do Tratado da Oração e da Meditação, de São Pedro de Alcântara, e dos Exercícios Espirituais, de Santo Inácio de Loyola. Isso a preparou para a vida espiritual interior que seria o mote de seu apostolado.

Ao voltar ao Carmelo depois de curada, Teresa não se adaptou ao cotidiano que considerava excessivamente relaxado entre as Irmãs, com uma vida de pouca oração, excesso de visitantes no Convento e muitas conversas frívolas. Ela mesma, em sua autobiografia, confessa ter muitas vezes tomado parte naquele relaxamento. Certa ocasião, ao deter-se sob um crucifixo com a imagem de Cristo ensanguentado, perguntou: “Senhor, quem vos colocou aí?” E ouviu como resposta uma voz que lhe disse: “Foram tuas conversas no parlatório que me puseram aqui, Teresa“. Este episódio reforçou nela o desejo de reformar-se. Mas reformar apenas a si mesma não seria o suficiente para ela.

Transverberação

O fato que decisivamente marcou a vida de Santa Teresa de Ávila aconteceu em 1560, uma graça mística em que ela viu um Anjo em forma humana, e sentiu que ele perfurava seu coração com um dardo diversas vezes. Segundo os relatos da própria Santa,

Eu tinha a impressão de que ele me perfurava o coração com o dardo algumas vezes, atingindo-me as entranhas. Quando o tirava, parecia-me que as entranhas eram retiradas, e eu ficava toda abrasada num imenso amor de Deus. […] A dor era tão grande que eu soltava gemidos, e era tão excessiva a suavidade produzida por essa dor imensa que a alma não desejava que tivesse fim nem se contentava senão com a presença de Deus. […] Não se trata de dor corporal; é espiritual, se bem que o corpo também participe, às vezes muito. É um contato tão suave entre a alma e Deus que suplico à Sua bondade que dê essa experiência a quem pensar que minto”

“O êxtase de Santa Teresa” (1646 – 1652), de Gianlorenzo Bernini, exposta na Igreja de Santa Maria da Vitória, em Roma.

Esta experiência de sentir o coração transpassado por uma grande ferida mística chama-se transverberação, e foi depois dela que Santa Teresa intensificou ainda mais sua vida de oração, meditação e contemplação, e foi traçando do que chamaria de Caminho da Perfeição.

Reformadora do Carmelo

Também por volta de 1560, Teresa conheceu o franciscano São Pedro de Alcântara, que a fez crescer ainda mais em seu itinerário de vida espiritual, e que lhe confirmou que suas experiências místicas eram divinas, e não demoníacas, como algumas pessoas quiseram fazê-la acreditar. Também por aquele tempo conheceu o carmelita São João da Cruz, que, junto com seu Superior, Padre Antonio de Jesus Heredia, apoiaram-na na reforma do Carmelo. Fora dos muros de Ávila, fundou o Mosteiro de São José, com disciplina mais austera. Aquela seria a primeira Casa da Ordem dos Carmelitas Descalços, voltada para uma vida de clausura, silêncio, estudos e ascese.

Junto com seu mentor espiritual São João da Cruz, fundou 32 Mosteiros dos Carmelitas Descalços: 17 femininos e 15 masculinos.

Doutora da Igreja

O caminho espiritual e o espírito de verdadeira reforma de Santa Teresa de Ávila foram sistematizados por ela em diversas obras cujo conjunto lhe valeu o título de Doutora da Igreja, por determinação de Paulo VI, em 1970.

Entre seus diversos escritos, destacam-se: Caminho da perfeição, pequeno tratado destinado às suas dirigidas espirituais, em que ela aponta alguns remédios para certas tentações miúdas, sugeridas pelo demônio, das quais talvez não façamos caso, justamente por serem tão pequenas; Castelo Interior, em que s santa postula os degraus da vida de oração da espiritualidade carmelita; e O livro da vida, autobiografia em que Santa Teresa descreve sua trajetória de oração, aperfeiçoamento da vida espiritual e até suas experiências místicas – a primeira obra em que um santo descreve seu caminho de santificação.

Morte e legado

Santa Teresa de Ávila morreu em 15 de outubro de 1582, em Alba de Tormes, aos 67 anos. Foi canonizada por Gregório XV, em 1622. O maior legado que a reformadora do Carmelo deixou à Igreja foi o exemplo de sua vida de oração. Com sua vida e seus escritos, deixou bem claro que não existe intimidade com Deus e consequente caminho para a santidade sem uma vida de oração. A Mãe das Carmelitas Descalças deixou bem claro que é na oração que Deus age em Seus filhos, para que eles se transformem. Para que rezemos amorosa e incessantemente, e não desanimemos nesse caminho de intimidade com Nosso Senhor, clamemos:

Santa Teresa de Ávila, rogai por nós!

 

A Trasnverberação de Santa Teresa de Ávila

 

Quando Santa Teresa um dia orava

a fitar Jesus Cristo que sangrava

 

na parede, pendendo numa cruz,

a Ele perguntou: “Por que, Jesus,

 

Tu choras?”, e escutou logo em seguida:

“Eu choro por tua língua desabrida

 

e má, que nesta cruz me colocou!”

Teresa, em doído pranto se prostrou,

 

a olhar os seus pecados, quando enfim

apareceu-lhe ao lado um Querubim

 

que lhe acertou em cheio o coração

com um dardo abrasado na Paixão

 

dolorosa de Deus Nosso Senhor.

Sentiu no peito inominável dor,

 

que lhe punha as entranhas a gritar

e ao mesmo tempo a punha a suspirar

 

de alívio, por estar toda tomada

do amor de Deus, e de alma transformada,

 

após viver sua transverberação,

seguiu o caminho rumo à perfeição.


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