BRUNA TORLAY丨Escola, barbárie, família e civilização

Bruna Torlay
Bruna Torlay
Estudiosa de filosofia e escritora, frequenta menos o noticiário que as obras de Platão.

Eis que o trágico desfecho de ataques, por parte do adolescente desequilibrado que premeditou os atos, numa escola estadual de São Paulo desperta no jornalismo indecente ao nosso redor argumentos pífios sobre a razão da violência. Assassinos são sempre culpados. A conversa fiada sobre as “causas da violência” apenas tira o foco do ponto central: seres-humanos não educados tendem à barbárie. Por isso civilizar é imperativo. O menino agiu de forma bárbara OU porque não é civilizado; OU porque é um psicopata mesmo.

Uma observadora atenta do ocorrido me enviou a conta do Twitter do biruta. A partir dali, percorri um submundo de barbárie que me fez lembrar muito o linguajar empregado por duas meninas que foram colegas da minha filha de 12 anos em sua escola anterior, uma delas com fortes tendências suicidas, uma mãe infeliz, um pai alcóolatra e um poço de inveja no lugar da alma. Completamente disfuncional. A família, bárbara desde o núcleo, transmitiria o que à filha, a não ser o mundo que é o seu? Pode ser que a menina seja salva pela consciência. Pode ser que, antes disso, dê cabo nela. “Não é suicídio se você já está morto por dentro”, são frases que lemos nesse submundo de barbárie.

Chegamos ao ponto óbvio: a escola não é capaz de civilizar. Educação não é treino em habilidades específicas que não necessariamente servirão a alguma coisa. A escola de hoje é uma instituição irrelevante; falha; deformante ou pervertida. Toda a escola. Dê o poder espiritual, a missão civilizatória, ao Estado e veja a educação falir. Já falei isso antes e morrerei repetindo.

“Ah, mas por que sua filha vai à escola?”

Porque educação ela recebe em casa, de modo que a escola não tem o poder de destruir a civilização que eu a ajudo a erigir dentro de si, embora seja obrigatória e a divirta em razão da oportunidade de estar com pessoas de sua idade e aprender algumas coisas de vez em quando.

Mas que famílias entendem que a coisa chegou nesse nível? Que a escola se pouco ou nada ajuda, às vezes atrapalha?

“Mas como?”

Reforçando o niilismo de almas deformadas pelo vazio civilizatório cavado pela má educação. Imagine uma pessoa mal educada, o que significa sem-caráter; ou que não valoriza beleza, não sabe distinguir verdade de falsidade, não entende o que faz aqui e para onde deve se dirigir ao longo da vida; não tem modelos, parâmetros, pontos de partida. Pode conseguir ou não, ao longo de sua vida, acertar essas lacunas. Caso a incapacidade de se autorregular, de controlar seus impulsos, seja preponderante por tempo demais, pode não ver brecha para buscar a boa educação. E viverá para reagir às emoções até encontrar o sentido, o que pode levar um tempo e exigir experiências cruéis. Quanto tempo precisará, só Deus sabe. O garoto não agiu exatamente sozinho. Há indícios de que pertença a um grupo que se organiza via discord, o app por meio do qual crianças acessam o submundo da segurança de seus quartos.

Nesse meio-fio, que significa a escola? Nada. E quando a Instituição associada à missão civilizatória não a realiza, a barbárie presente dentro de alguns mais cedo ou mais tarde se manifesta. Foi isso o que aconteceu ali. Ironicamente, dentro da própria escola. Mas muito antes, no interior de uma alma que projetou ali dentro uma desgraça interior que não foi virtuoso o bastante para vencer. Como outros tampouco o são, o que os aproxima.

“Então as causas da violência estão na escola?”

Não, infeliz. Assassinos são sempre culpados. Mas é imperativo às famílias entender que a escola é o último lugar em que seu filho entenderá o sentido da civilização. Logo, assumir o leme das almas que preza em vez de lamentar não ter um terceiro a quem delegá-las é a melhor coisa que você pode fazer nesta sua breve vida.

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