BRUNA TORLAY丨Conservadores, revolucionários, liberais e socialistas

Bruna Torlay
Bruna Torlay
Estudiosa de filosofia e escritora, frequenta menos o noticiário que as obras de Platão.

Vamos supor que uma pessoa valorize a moralidade e rejeite a ação política caracterizada pela máxima “os meios justificam os fins”; mas que ela julgue a distribuição de renda necessária, a religião, um meio de domínio das consciências, a corrupção, o mal maior de todo sistema político possível. Uma pessoa assim é socialista, mas não é revolucionária. E aí, ela é “esquerda” ou “direita”?

A dupla de oposições direita/esquerda; revolucionário/conservador, combinadas de todas as maneiras possíveis, permite desvincular catilinários (revolucionários golpistas) de esquerda; assim como possibilita entender a estranha expressão “esquerda conservadora”. Evidentemente, o primeiro de quem a ouvi é uma pessoa sempre mal compreendida e de quem muitos preferem desconfiar: Paulo Sanchotene, colunista deste nosso portal.

Em alguma live que fizemos, ele usou a expressão “esquerda conservadora”, fenômeno que conhecera ao buscar notícias sobre o cenário político britânico. Devo ter perdido uns mil inscritos naquela brincadeira, ou reflexão, de meu convidado. Mas recebi uma ideia inusitada sobre a qual refletir desde então, até me cair nas mãos o artigo da jornalista Paula Schmitt, publicado no Portal Poder 360, sobre por que vota em Bolsonaro, e cuja resposta é “Porque sou de esquerda”.  

A jornalista defende políticas públicas socialistas do começo ao fim, mas, vejam só, dentro dos limites do Estado de Direito moderno, artefato propriamente liberal. Lembram daquela história sempre repetida pelo deputado federal Luiz Philippe de Orléans e Bragança com respeito aos méritos de uma Constituição Liberal? Os socialistas atuam, mas sem impor à sociedade o risco do totalitarismo. Ele está certo. Por isso esquerdistas conservadores (no sentido de antirrevolucionários) gostam do Estado de Direito, enquanto comunas sediciosos, tipo o Zé Dirceu, passam madrugadas refletindo como pervertê-lo.

É verdade que comunistas são uns desgraçados com quem é inviável discutir. A trapaça não é falha de conduta individual, entre comunistas, mas modus operandi. Porque comunistas são catilinários, são revolucionários, são pessoas que desejam pôr abaixo essa ordem chamada Estado de Direito. O seu gesto político natural é o abuso de poder, ainda que mascarado de altruísmo. A tal ponto que forjaram (e colou!) a noção de “corrupção altruísta”.

Por outro lado, temos os catilinários anticomunistas, ou fascistas — tão distinto do comunista quanto o palmeirense do corintiano. O fascista é o revolucionário que se apropria do patriotismo como símbolo. Os comunistas têm por símbolo o divisionismo entre os homens. Onde há disputa ou divisão, há uma sociedade doente que só poderá ser curada pela mão forte de um estado centralizador que a todos contenha, produzindo em si mesmo a síntese superior do conflito originário. O revolucionário “de direita” (que os comunistas nomeiam fascistas), entende que a identidade nacional de um povo, manifesta no poder total do líder carismático, é a única forma de superação do divisionismo originado da luta de classes, e demais conflitos que fissurem a malha social. Burocracia ou pessoalismo são modos distintos, no esquema mental revolucionário, de estabelecer o poder totalitário. E essas duas faces do modo revolucionário de entender a política são, na cabeça de comunistas para quem nada existe fora do comunismo, “direita” e “esqueda”. Sabe aquele jornalista militante que nos aborrece com sua limitação mental de todo dia?

Se tem algo que o conservadorismo repudia desde sempre, é a matriz revolucionária como base da disputa política. Porque essa matriz sempre desanda em concentração de poder, controle das consciências, monopolismo, criminalização da opinião, etc., em suma, em totalitarismo. E é o totalitarismo que os conservadores repudiam. Razão por que a jornalista teria respondido à própria pergunta em termos mais apropriados se, em vez de dizer que vota em Bolsonaro “porque é de esquerda”, afirmasse que o faz porque não é revolucionária, razão pela qual, mesmo defendendo políticas públicas socialistas, se põe primeiro ao lado dos conservadores.

Não é um assunto fácil. Em minha percepção, um igualitarista, ou socialista com apreço pelo estado liberal costuma ser o idiota útil perfeito dos comunistas, razão pela qual a partir do momento que o termo “esquerda” é absorvido pelo ideário comunista, o estado de direito liberal, que realmente prevê disputa dentro da ordem legal, fica irremediavelmente comprometido.

Para além de direita e esquerda, enquanto os revolucionários rondarem o ordenamento político, paira sobre nós a sombra do caos.

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