MURALHA DE LIVROS | Excelência antes do fim

Leônidas Pellegrini
Leônidas Pellegrini
Professor, escritor e revisor.

Destaque para um clássico formador da literatura ocidental lançado pela Sétimo Selo e uma importante obra sobre a educação do imaginário, publicada pela Kírion

A Muralha desta semana traz uma tradução inédita e única de uma obra fundante da literatura ocidental, um importante lançamento sobre a formação e a educação do imaginário infantil, e outro sobre a filosofia da ciência, além de duas peças teatrais de um gigante brasileiro mais conhecido por seus romances e contos. Todas elas, obras que conferem excelência a esta penúltima edição do mês mais longo do ano. Confira os tijolos a seguir!

Destaques

O primeiro destaque da semana, da Sétimo Selo, é uma das obras fundantes da literatura ocidental e do gênero épico, Eneida, de Virgílio, que narra a saga de Eneias, herói troiano que, após escapar da destruição de Troia com auxílio divino, viaja rumo ao território da Itália, onde se torna o fundador da cidade que viria a crescer até se tornar o maior Império sobre a terra: Roma. Epopeia de fôlego, trata-se de um clássico na primeira acepção do termo: obra que se torna paradigma poético e modelo a ser imitado – é nela que tantos grandes poetas, de Dante a Camões, se inspiraram. Obra que é fruto do trabalho de Virgílio em seus últimos 10 anos de vida, epopeia em que o grande artista do verso e da música das palavras se debruça não apenas sobre a grandeza de Roma, mas da própria natureza humana, tão luminosa quanto sombria, tão alicerçada no passado quanto no futuro.

Acompanhada de textos introdutórios, resumos dos cantos, notas e um dicionário dos principais personagens, termos e lugares, a tradução de Carlos Ascenso André (um dos mais ricos diferenciais desta edição), especialista em literatura latina, é fruto de muitos anos de esmero e pretende ser “um compromisso entre um trabalho de qualidade e rigor e uma obra ao alcance do grande público”. A tradução em verso livre mantém a proximidade ao original e oferece ao leitor a possibilidade de travar contato com a obra-prima de Virgílio e um dos livros fundamentais da nossa civilização.

Confira abaixo um trecho desta tradução única:

“Canto as armas e o guerreiro, o primeiro que, de terras de Troia,

em fuga aos fados, alcançou a Itália e as praias

de Lavínia, sem tréguas baldeado por terra e por mar,

por obra de deuses, em razão da fúria sempre viva da terrível Juno;

e que também muitas tormentas em guerras padeceu, até fundar a cidade

e introduzir os deuses no Lácio, de onde vem a nação latina

e nossos pais albanos e as altas muralhas da grande Roma.

[…]

Havia uma cidade antiga (colonos tírios a habitaram),

Cartago, frente à Itália, mas longe da foz do Tibre,

rica em posses e intratável nas artes da guerra;

Juno a acalentava, diz-se, a ela mais que a qualquer terra,

menosprezando, até, Samos; ali as suas armas,

ali o seu carro; este reino havia de dominar povos,

se os fados assim consentissem; desde então, a deusa para tanto porfia e trabalha.

Mas era certo que uma estirpe chegaria, com origem em seu sangue troiano,

ouvira ela dizer, para arrasar, um dia, as muralhas tírias;

e daqui um povo, rei de vastos domínios e altivo na guerra,

iria surgir, para destruição da Líbia; assim tinham fiado as Parcas.”

O outro destaque é mais uma joia da Edições Kírion, Duelo com dragões: a batalha pela imaginação do seu filho, de Michael D. O’Brien. Nesta obra, o professor e consagrado escritor canadense mostra como, nos produtos da cultura de massa moderna, e mesmo sob a própria “guerra cultural”, está latente uma batalha mais antiga e permanente: a revolta do dragão contra Deus e contra o homem. Duelo com dragões trata da mudança de uma visão de mundo baseada no cristianismo para outra nascida de um paganismo atualizado, mas que vem embalada como “cristã”. Dirigindo o olhar para livros de fantasia cristã, entre os quais estão os de Tolkien, C. S. Lewis e George MacDonald, O’Brien explica que papel tem a literatura na formação das crianças e no desenvolvimento infantil, e que batalha é essa que os pais devem travar. Confira abaixo um trecho na obra:

“A mente moderna não é mais formada sobre uma base de verdades absolutas, que as sociedades do passado encontraram escritas na lei natural e que nos foram reveladas mais explicitamente no cristianismo. Houve um tempo em que canções e histórias transmitiam esse universo de conhecimento de geração em geração.

Mas nossas canções e histórias estão sendo usurpadas. Filmes, vídeos e televisão comercial chegaram perto de substituir a Igreja, as artes e a universidade como principais formadores do sentido moderno da realidade. A maioria das crianças agora bebe desses poços sujos, que parecem impuros e insalubres para qualquer um, exceto para os mercenários e ambiciosos por dinheiro.”

Outros lançamentos

Pela Vide Editorial, Natureza e modelo: uma síntese de filosofia da ciência e filosofia da natureza, em que o historiador da ciência William A. Wallace (1918 – 2015) expõe o quanto o intelecto humano precisa se valer de analogias para explicar a natureza.  Daí, nasce a demanda de se conceber modelos como “andaimes” nos quais se apoiar para erigir uma construção teórica. Mas será que isso resume tudo o que a modelagem de fenômenos permite? Quantos e quais tipos de modelo existem? Todo modelo está destinado a ser descartado depois de usado? Qual o papel pedagógico do uso de modelos? Nesta obra, Wallace constrói um ensaio magistral sobre em que consiste a modelagem de fenômenos e também uma justificativa da necessidade de se ter consciente que, antes de fazer ciência, se faz filosofia — não é que se deva fazer filosofia, mas que já fazemos, conscientemente ou não.

Pelo IBESEC, por ocasião do Dia Mundial do Teatro (celebrado na última terça-feira, 21), duas peças de Machado de Assis: Quase ministro e O caminho da porta, obras em que o leitor poderá ter contato com o humor machadiano em uma gênero literário pelo qual o Bruxo do Cosme Velho não ficou tão conhecido. A primeira, escrita para ser representada na casa de um amigo do autor em 1863, retrata a situação de um deputado do Brasil Império, em plena ascensão de sua carreira, que passa a ser assediado por todo tipo de bajulador desde que línguas fofoqueiras da antiga Capital Federal começam a “empossá-lo” ministro. A segunda, representada pela primeira vez em 1862, apresenta uma divertida disputa entre jovem Valentim e o experiente Inocêncio pela mão da viúva Carlota, que acaba os fazendo tomar “o caminho da porta”.

As peças podem ser adquiridas separadamente ou em conjunto, com um interessante desconto na compra do combo.

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