Para que alguém seja condenável é necessário que seja, antes, livre para pensar e, portanto, decidir. Sem essa liberdade, seria inimputável, refém de um destino determinado desde fora.
A liberdade, por seu lado, possui o impulso por expansão. Quem pensa quer pensar sempre mais, conhecer sempre mais. Por isso Aristóteles dizia que os homens têm um desejo natural pelo conhecimento.
O pecado de Adão, considerando que ele era livre, não foi o exercício da liberdade de pensar, mas sua extrapolação. Pecou por reivindicar autonomia e querer entender as coisas por conta própria, tornando-se conhecedor do bem e do mal.
Deus jamais exigiria que os homens abdicassem de sua liberdade de pensar. A ideia sempre foi auxiliá-los no processo de desenvolvimento do conhecimento e da autoconsciência. Mas eles invejaram os deuses e, não contentes em ser livres, quiseram ser soberanos.
A partir do pecado adâmico, a sina humana passou a ser repeti-lo continuamente. A história do pensamento é a história de indivíduos tentando, por si mesmos, desvelar a realidade.
Quando, porém, por volta do século XVIII, eles acreditaram estar aptos para concluir sua missão, constataram que eram incapazes de fazê-lo. Perceberam que não podiam confiar em seus sentidos e se conformaram em afirmar a suficiência de seus conteúdos internos.
Com a constatação da incognoscibilidade do real, os homens romperam com ele e lançaram-se numa queda vertiginosa para dentro de si mesmos, onde havia só escuridão e ecos de ruídos fracos e reflexos plácidos do mundo exterior.
Cada um então tornou-se sua própria caverna, com a conscência acorrentada, olhando apenas as sombras da realidade, tratando-as como se realidade fossem.
A partir dessa penumbra interior, os indivíduos passaram a clamar por resgate. Envoltos em escuridão, esperam que alguém lhes mostre a luz.
O problema é que, incapazes de discernir a origem das ajudas que lhes são oferecidas desde fora, acabam aceitando o socorro das primeiras vozes que lhes parecem fazer algum sentido. Não por acaso, estão sendo constantemente enganados.
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