BRUNA TORLAY丨Quando o lucro é prioritário

Bruna Torlay
Bruna Torlay
Estudiosa de filosofia e escritora, frequenta menos o noticiário que as obras de Platão.

Não dá pra se manter veículo de comunicação decente, interessante, criativo e relevante quando o lucro é prioritário. A coisa descamba para o entretenimento. O circo sempre dá lucro, sem necessariamente ter vínculo com informação ou cultura.

A Jovem Pan, cuja prioridade é o lucro, investiu convictamente na mescla entre circo e jornalismo de opinião. A exceção do clássico Jornal da Manhã, programa em que a informação é o prato principal do cardápio, e o circo uma espécie de acompanhamento, a programação quase inteira prioriza outra coisa: debate político sob a forma do entretenimento. Constantino, ao lado de quem já trabalhei por lá, é a estrela maior no formato.

É péssimo comentar fenômenos com os quais se tem algum vínculo pessoal. Pessoas mesquinhas que medem o próximo com a própria régua acreditam piamente tratar-se de “ressentimento”. Ridículo. A coisa mais interessante na Jovem Pan sempre foi o entretenimento, e não me surpreende que a emissora tenha apostado nisso ao absorver em sua grade o jornalismo opinativo. É isso e nada mais. Quem manteria por tanto tempo pessoas caricatas (e divertidas) como Marco Antonio Villa ou Adrilles Jorge no ar, não tivesse por propósito o entretenimento?

No curto período em que fui convocada a participar do Morning Show, senti no primeiro dia que era um circo, razão pela qual não vi sentido em permanecer. Sou uma professora de filosofia que, em seu tempo livre, ouve as aulas do Pe. Paulo Ricardo. Não sou lá muito chegada em “diversão”. Divertir-se é distrair-se e minha felicidade está na compreensão, e não no desvio. Era realmente uma tortura ter de ouvir a conversa de comadre sem pé nem cabeça; sem origem, fim ou fundamento (mas profundamente divertida para a plateia em busca de distração matinal insólita) ao longo de uma hora e meia. Os demais programas eram mais toleráveis, embora ter de ouvir notícias o dia inteiro tenha sido, durante o breve período em que estive por lá, terrivelmente embrutecedor, comparado à minha rotina normal.

Certamente a emissora depende de verbas públicas, razão outra não podendo haver para a troca de time seguir a alternância de poder. Mas quando o lucro é prioritário, o entretenimento é o caminho seguro para manter a audiência, adequando-se a imperativos dinâmicos. Emílio Surita é o melhor comunicador da emissora e sempre vai divertir sua plateia, com ou sem política no cardápio – que ali entra como antes entravam biquinis, imitações, bundas, jogos e pegadinhas. É um programa de humor. Muda o governo, permanece, nos milhares de paulistanos às voltas com tarefas mecânicas ou engarrafamento, o desejo de rir.

Algumas pessoas estão impressionadas com as alterações na emissora, as demissões sumárias e sem maiores explicações (não é nada pessoal, acontece com todo mundo), a aparição de um petista estranhamente insosso decidindo que Constantino é o puxa-saco, e ele o comentarista sério, etc, etc. O pacote inteiro parece-me absolutamente previsível. Agora o tucanato próximo a Gilmar Mendes volta a ocupar o palco, pois o circo precisa continuar e o público permanece ali à espera das próximas novidades.

Que meia dúzia de conservadores tenham passado por ali recentemente foi circunstancial, razão por que tolo é o público que acredita piamente na possibilidade de se manter um veículo de comunicação de linha editorial consistente quando o lucro é prioritário. Nesse caso, o melhor negócio é simplesmente apostar no entretenimento, pareça ele o que a audiência quiser fazê-lo parecer… E quem estiver em busca de discurso autêntico, sério e com profundidade real, ganha mais em ler os magníficos comentários de Sêneca, Santo Agostinho e Pascal sobre o sentido dessa mazela chamada divertimento.

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5 COMENTÁRIOS

    • Eu assistia a JP e aí a Bruna chegou. Quando vi ela falando notei que tinha algo errado com a jovem pam, era diferente o que sai de sua boca, tinha um objetivo forte ali que eu ainda não reconhecia. Comecei a seguir a Bruna e de repente tudo mudou, a jovem pam perdeu sabor e notei que não era aquilo que eu realmente buscava. A Bruna saiu da Jovem Pam e eu saí de lá também, assinei a esmeril e me deparei com um universo totalmente novo e contemplei cada palavra nova que conhecia. A esmeril está no caminho daquilo que o Olavo dizia, que é preciso introduzir, através de muito trabalho, cultura no país, através de livros, obras e muito trabalho. A jovem pam só mostra debate e não introduz cultura. Aqui você aprende sobre o pensar, aprende a desenvolver seu olhar clínico, admirar o belo e ainda aprende o que é se divertir no tempo livre como esse post acabou de fazer. O povo Brasileiro precisa tirar a trava do seu olho e buscar aprimorar o olhar clínico. Obrigado Bruna, obrigado revista Esmeril por tudo que vocês me ensinam e ainda vão ensinar.

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