VITOR MARCOLIN | Justificativa poética

Vitor Marcolin
Vitor Marcolin
Ganhador do Prêmio de Incentivo à Publicação Literária -- Antologia 200 Anos de Independência (2022). Nesta coluna, caro leitor, você encontrará contos, crônicas, resenhas e ensaios sobre as minhas leituras da vida e de alguns livros. Escrevo sobre literatura, crítica literária, história e filosofia. Decidi, a fim de me diferenciar das outras colunas que pululam pelos rincões da Internet, ser sincero a ponto de escrever com o coração na mão. Acredito que a responsabilidade do Eu Substancial diante de Deus seja o norte do escritor sincero. Fiz desta realidade uma meta de vida. Convido-o a me acompanhar, sigamos juntos.

A morte é obrigada a esperar

Já era noite. Abri o computador munido da intenção de continuar a narrativa sobre o sujeito cuja morte não fora reconhecida pelo Estado. Mas eis que, juntamente com a luminosidade do ecrã, um pedaço de papel saiu do computador. Não obstante o cansaço do dia de labuta, não consumi mais do que cinco segundos para assimilar a diatribe que me ocorria: era um poema que eu, na véspera, copiara de uma antologia, e que ficara sobre o teclado do notebook. Às vezes, pratico caligrafia — arte injustamente malbarateada. Minha letra é, numa economia de adjetivos, correta. O poema, apesar da forma anacrônica, versa, em essência, sobre a realidade daquele sujeito que viveu no século XVIII e que, para o Estado, não morreu. É incompreensível, portanto, para os tatus de monóculo. A autoria é de Augusto dos Anjos, e o reproduzo integralmente aqui.

Numerar sepulturas e carneiros,
Reduzir carnes podres a algarismos,
— Tal é, sem complicados silogismos,
A aritmética hedionda dos coveiros!

Um, dois, três, quatro, cinco… Esoterismos
Da Morte! E eu vejo, em fúlgidos letreiros,
Na progressão dos números inteiros
A gênese de todos os abismos!

Oh! Pitágoras da última aritmética,
Continua a contar na paz ascética
Dos tábidos carneiros sepulcrais

Tíbias, cérebros, crânios, rádios e úmeros,
Porque, infinita como os próprios números,
A tua conta não acaba mais!

***


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