SANQUIXOTENE DE LA PANÇA | Conservadorismo na Prática: exercício hipotético paradigmático

Paulo Sanchotene
Paulo Sanchotene
Paulo Roberto Tellechea Sanchotene é mestre em Direito pela UFRGS e possui um M.A. em Política pela Catholic University of America. Escreveu e apresentou trabalhos no Brasil e no exterior, sobre os pensamentos de Eric Voegelin, Russell Kirk, e Platão, sobre a história política americana, e sobre direito internacional. É casado e pai de dois filhos. Atualmente, mora no interior do Rio Grande do Sul, na fronteira entre a civilização e a Argentina, onde administra a estância da família (Santo Antônio da Askatasuna).

“Dom Quixote lutando contra os moinhos de vento”. Ilustração de G. A. Harker. Ano: 1910.


O conservador, conservador de fato, pensa e age sobre o mundo de forma diferente do que o revolucionário. É necessário conhecer e entender a diferença. Para isso, a coluna de hoje traz um exemplo através de um exercício hipotético aplicado ao futebol brasileiro.


Às vezes, dá mesmo vontade de explodir tudo e começar do zero. Porém, quem quer reconhecer-se como “conservador” [inclusive os “liberais-conservadores” ou “liberais clássicos”] não pode cair nessa tentação revolucionária.

Querer mudar tudo é um desejo tipicamente revolucionário. Um conservador assume as circunstâncias por piores que sejam e busca aprimorá-las pouco a pouco.

O objetivo final tampouco é uma transformação total. Isso é “reformismo”, e o reformista nada mais é que um revolucionário paciente.

O final não é uma preocupação conservadora. O conservador quer proteger e aflorar o que há de bom, belo, justo, e verdadeiro no mundo a partir das circunstâncias dentro das quais ele se encontra.

Enfim, o conservador busca extrair o Bem daquilo que parece mal; o Belo, do que parece feio; o Justo, do que parece injusto; e o Verdadeiro, do que parece falso. Assim, aos poucos, a essência das coisas vai se esclarecendo, paradigmas de excelência vão se formando, e as circunstâncias vão se aprimorando.

O fim não importa porque a finalidade do jogo é seguir jogando. A tarefa é sempre a mesma: separar o joio do trigo – independentemente da quantidade de cada um. O primeiro passo é aceitar que o joio sempre cresce junto ao trigo, sendo impossível arrancar-se o joio sem também matar o trigo.


Na terça-feira, a CBF anunciou o calendário para 2024 sem grandes novidades. Francamente, eu adoraria mudar absolutamente tudo no futebol brasileiro; mas, por conservadorismo, não publicarei aqui nenhuma das minhas milhares ideias revolucionárias. [Agora, caso tais ideias sejam do teu interesse, no entanto, basta comentar abaixo que tas apresento.]

Mostrarei aqui como é possível pegar a atual estrutura que temos hoje e, sem grandes alterações, transformá-la nalgo melhor – apenas considerando as necessidades prementes e a história do nosso futebol. Se, por ventura, surgirem novas circunstâncias, aí fazem-se outras alterações.

De novo, a tarefa jamais muda.

Grosso modo, o futebol brasileiro hoje é estruturado da seguinte maneira:

– duas temporadas: estadual/regional (3 meses); nacional (7 meses);
– a temporada nacional tem duas competições: o Campeonato Brasileiro (com 3 divisões, mais um torneio de acesso); e a Copa do Brasil (com fase classificatória e fase final);

Apesar de desgostar dessa estrutura, ela seria mantida tal e qual.

Quais as mudanças propostas, então?

São cinco as sugestões:
– estaduais e regionais no fim do ano;
– Copa do Brasil reorganizada;
– Série C igual às séries A e B;
– Série D estadualizada;
– retorno do Rio-São Paulo e da Sul-Minas.

O objetivo é fazer com que o calendário seja anual (“cheio”) para o máximo possível de clubes, além de valorizar mais todos os torneios realizados. Segue explicação.

Primeiro: passar a temporada estadual/regional para o fim do ano

a. ao invés de o ano terminar com apenas uma torcida feliz e alegre, haveria 27 assim.
b. os estaduais se valorizam, pois os clubes sem títulos teriam nesses a última oportunidade para salvar o ano.
c. ademais, as competições nacionais não terminariam junto com as competições sul-americanas, prejudicando menos os clubes que estivessem disputando os títulos continentais.

Segundo: modificar a composição da Copa do Brasil (sem alterar a estrutura)

-> Ao final, no Anexo, apresento um resumo da fórmula

a. estariam classificados diretamente à fase final, apenas o último campeão e os campeões regionais.
b. as demais vagas seriam preenchidas por clubes oriundos da fase classificatória, sendo que os campeões estaduais teriam asseguradas cotas.
c. isso reforça o vínculo da competição com os torneios estaduais, que está na sua origem, e valoriza os títulos estaduais ao garantir maior participação de campeões na fase final.

Terceiro: Série C por pontos corridos em turno-e-returno

a. a Série C faz parte da “Liga Nacional” com a séries A e B, sendo justo que tenha a mesma fórmula de disputa.

Quarto: Série D com Primeira Fase estadualizada e quatro campeões

a. ao invés de torneio nacional com fase de grupos e fase final, a primeira fase (fase de grupos) seria dentro de cada estado com os clubes que não estivessem na Liga Nacional (séries A/B/C).
e. a fase final teria 4 chaves eliminatórias nacionalizadas, e o campeão de cada chave garantiria o acesso à Série C.

Quinto: recriar o Rio-São Paulo e a Sul-Minas

-> Ao final, no Anexo, apresento um resumo das fórmulas

a. com isso todas as regiões teriam igualdade de representação na fase final da Copa do Brasil, o que não ocorre hoje.
b. os novos torneios teriam entre 3 e 4 datas para não inchar muito mais o calendário (que já é lotado).

Essas, portanto, seriam as alterações. Nada exige esforços demasiados. Porém, a mudança beneficiaria os clubes menores e as federações estaduais, sem prejudicar os clubes maiores – que também teriam a ganhar com isso.



ANEXO –

Para quem interessar, seguem detalhes das fórmulas de disputa:

1. Copa do Brasil
13 datas; de 91 a 96 clubes
– Fase Classificatória (3 datas): de 86 a 91 clubes
– Fase Final (10 datas): 32 clubes

* O número de clubes varia de acordo com a quantidade de clubes campeões, pois um mesmo clube pode vencer até 3 torneios diferentes: estadual, regional, e a Copa do Brasil.

a. estão classificados diretamente à Fase Final, apenas o último campeão e os campeões regionais.
b. as demais vagas (de um total de 32) são preenchidas por clubes oriundos da fase classificatória, sendo que os campeões estaduais têm asseguradas 11 dessas.

I. Fase Classificatória
a. é disputada por: clubes campeões estaduais; demais clubes das séries A, B, e C nacionais; e melhores clubes do ranking dentre os que sobraram.
b. todas as etapas são disputadas em jogo único.
c. 11 vagas da Fase Final são exclusivas de campeões estaduais.
d. os clubes campeões eliminados passam à 3ª etapa da Fase Classificatória (última) onde disputam as demais vagas disponíveis na Fase Final contra os clubes não-campeões vencedores da 2ª etapa.

II. Fase Final
a. os 32 clubes classificados disputam séries eliminatórias em ida-e-volta até se determinar o campeão.
b. São 5 etapas no total.

2. Torneio Rio-São Paulo
3 datas; 8 clubes
– eliminatórias de jogo único.
a. são 4 clubes por estado, de acordo com a classificação geral no campeonato estadual do ano anterior.
b. o mando do jogo é da equipe melhor classificada no respectivo estadual, exceto a Final cujo mando é alternado entre os estados a cada ano.

3. Copa Sul-Minas
4 datas; 4 clubes
– eliminatórias em séries de ida-e-volta.
a. é disputada pelos campeões de cada estado.
b. o mando do segundo jogo é alternado a cada confronto entre os estados – exceto o 1º, determinado por sorteio.
c. os confrontos semifinais são alternados entre os estados num ciclo de 3 anos.

4. Série D
de 34 a 38 datas
– Fase Classificatória: 27 estados
– Fase Final: 8 datas; 64 clubes

I. Fase Classificatória
a. a primeira fase (Fase Classificatória) teria entre 26 e 30 datas, a critério de cada estado.
b. o número mínimo de datas para a etapa de pontos corridos é 26.
c. cada estado teria entre 1 e 4 vagas para a Fase Final, mais 1 vaga extra por clube rebaixado da Série C no ano anterior (total: 64 clubes)

II. Fase Final
a. a fase final seria disputada em séries eliminatórias de ida-e-volta.
b. a fase final teria 8 datas (4 chaves de 16 clubes), com clubes dum mesmo estado em chaves diferentes sempre que possível – ou seja, se até 4 vagas.
c. o campeão de cada chave garantiria o acesso à Série C.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Abertos

Últimos do Autor