Os reformadores sociais não conseguem “ressignificar” o trabalho do maior escritor brasileiro
Cercado por amigos e admiradores, Machado de Assis morreu no dia 29 de setembro de 1908. Ainda em vida, o escritor responsável por criar a Academia Brasileira de Letras fora considerado um talento extraordinário; e, depois de sua morte, recebeu a justa alcunha do maior homem de letras que o Brasil já dera ao mundo. Machado fora o exemplo perfeito da nova classe média que ascendera ao fim do Império.
Originalmente pobre, o escritor, sempre em busca dos seus objetivos, da realização dos seus sonhos, galgara os mais altos patamares da sociedade da corte. De pobre rapaz aprendiz de tipógrafo a fundador da Academia Brasileira de Letras. Alguns biógrafos salientam, não sem exageros, o extremo esforço que Machado, na condição de rapaz pobre e, pasmem, de mestiço, teve de despender para atingir os seus objetivos, cumprir o seu dever, atender à sua vocação.
Não surpreende que a universidade brasileira, mera redação da propaganda ideológica, esforce-se para vender a imagem do grande escritor como garoto propaganda das causas de “representação” e “ressignificação” social. A molecada ingênua recém-chegada ao campus compra, praticamente sem nenhum esforço, a narrativa dos professores adeptos das ideias da Escola de Frankfurt, dos mestres do conhecimento que pregam a Democracia, a defesa do Estado Democrático de Direito, a religião da Ciência e, no entanto, ensinam unilateralmente somente os representantes de uma única corrente de pensamento.
Da realidade só o que se pode fazer é fugir e se esconder, como o casal no Éden. Sabe-se que, nas últimas duas décadas do Império, no período que coincidiu com o final da Guerra do Paraguai, surgiu no Brasil — especialmente na corte do Rio de Janeiro — uma nova classe média que congregava escritores, jornalistas, dramaturgos, médicos, engenheiros, advogados, músicos e pessoas livres que passaram a atuar na consolidação da identidade nacional do país.
Esta nova classe média apresentava um elemento que a diferenciava de todas as outras do mundo à época: era composta por um percentual significativo de miscigenados. Os mestiços faziam-se presentes em todas as classes sociais, em todas as repartições públicas, redações de jornais, partidos políticos, organizações religiosas e militares. Lá estavam eles, os filhos dos brancos com as negras, das lusitanas com os caboclos, dos ibéricos com as mulheres de Pindorama ativos e operantes na consolidação da cultura e da sociedade brasileira.
Há poucos anos antes do início do século XX o Brasil já experimentava os frutos daquilo que, décadas mais tarde — já na República — Gilberto Freyre vai chamar de Democracia Racial. Exemplo maior fora Machado de Assis. O escritor tomou posse da alta cultura, impregnou-se dela e, consciente deste senso de universalidade que só a Literatura detém, escreveu para sempre o seu nome na História daqueles que se dedicam à causa do entendimento da condição humana. Sem ajuda do governo, sem verbas estatais, sem cotas raciais, sem a piedade dos líderes dos movimentos sociais, só com a virtude do mérito, objetivamente.
Com informações do portal History UOL e dos livros Pereira, Lúcia Miguel, Machado de Assis, estudo crítico e biográfico, Livraria do Senado Federal, Brasília, 2019; Corção, Gustavo, O desconcerto do mundo, Vide Editorial, São Paulo, 2019; e Filho, Barreto, Introdução a Machado de Assis & outros ensaios, TopBooks editora, Rio de Janeiro 2014.
“Está morto: podemos elogiá-lo à vontade”.
Machado de Assis
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