Três heroicos jesuítas da América do Sul
Hoje é dia de São Roque González, Santo Afonso Rodríguez e São João del Castillo, mártires.
Filho de nobres espanhóis, Roque González nasceu em Assunção, em 1576. Educado na fé cristã, aos 15 anos já estava resolvido a seguir a vida religiosa. Ordenado sacerdote aos 24 anos, assumiu no Paraguai a missão de orientação espiritual dos índios, e teve tanto sucesso que o bispo de Assunção quis nomeá-lo pároco da catedral e depois vigário-geral da diocese, mas Roque recusou as nomeações para entrar na Companhia de Jesus. Em 1609, vestiu o hábito jesuíta e passou a dedicar-se à evangelização e catequização dos índios que habitavam as regiões do Paraguai, Uruguai, Argentina, Brasil e parte da Bolívia, junto de Afonso Rodríguez e João del Castillo, jesuítas espanhóis que a ele se juntaram nessa empreitada, estabelecendo diversas reduções.
Ações orquestradas por colonos impios e índios infiéis levaram os três jesuítas ao martírio em 1628. Em 15 de novembro daquele ano, após a celebração de uma missa na Redução de Caaró, na região do Rio Grande do Sul, índios rebeldes, instigados pelo pajé Nheçu, atacaram a redução e mataram o padre Roque com golpes de clava de pedra em sua cabeça. Padre Afonso, que também se encontrava por lá, foi morto a machadadas. A redução e uma outra vizinha, de São Nicolau, foram incendiadas, e muitos dos índios que ali habitavam foram assassinados. Em São Nicolau o padre João foi morto por apedrejamento.
A morte de Roque González envolve, ainda, o milagre do coração incorrupto, testemunhado por 53 pessoas. Após o matarem, os indígenas rebeldes arrancaram-lhe o coração e, naquele momento, escutaram a voz do padre dizendo: “Matastes a quem tanto vos amava e queria. Matastes, porém, só o meu corpo, porque minha alma está no Céu!” Furiosos, os índios atacaram o coração com flechadas e depois o jogaram no fogo, mas em vão: ele continuava incorrupto, e está até hoje preservado como relíquia sagrada em Assunção, onde é venerado.
Os padres Roque, Afonso e João são modelos de evangelizadores da América do Sul. Em tempos em que nosso Judiciário sanciona o tipo de barbárie a que eles foram submetidos, lembremo-nos destes heróis. São Roque González, Santo Afonso Rodríguez e São João del Castillo, rogai por nós!
Três heróis e um coração
Da América do Sul três heróis canto,
que santas reduções fundamentaram,
c’o inabalável fé e esforço tanto,
que indígenas pagãos transfiguraram
em povo crente, fiel, devoto e santo,
e assim milhares de almas resgataram.
Roque, Afonso e João eram chamados
os três heróis aqui homenageados.
Era Roque jesuíta de Assunção
e seus dois companheiros lá de Espanha,
e unidos trabalhavam na missão
de almas salvar, e cólera tamanha
a si atraíram, ódio tal e tão
profundo e cruel, que os vitimou a sanha
de colonos corruptos e impios,
e possessos indígenas gentios.
Após a santa missa em Caaró,
chegam os uivos de endemoninhados
guerreiros, que irascíveis e sem dó
tudo destroem, loucos, tresvariados,
reduzindo duas reduções a pó,
deixando no caminho assassinados
todos que encontram, curumins e madres,
e enfim, também, os Afonso e Roque padres.
Foi Afonso espancado, e a machadadas
sendo golpeado repetidamente
no crânio, enquanto em Roque eram pancadas
de clava desferidas cruelmente,
e foi, em São Nicolau, morto a pedradas
João, e enfim consuma a bruta gente,
em desvarios, deleites e delírios,
dos três heroicos padres os martírios.
No entanto, sobra à história mais um fato:
a indígena escumalha o coração
de Roque arranca, em derradeiro ato,
e a voz do padre escuta, qual trovão:
“Matastes a quem amoroso trato
sempre vos reservou, no entanto não
matastes meu espírito, que agora
aos céus ascende, onde por vós implora.”
Furiosa, flecha o coração a turba
e ao fogo o lança, sem sucesso, entanto:
a incandescente chama o não perturba,
e convertida, a choldra cai em pranto
c’o a consciência que se desconturba,
chorando em arrependimento santo,
e lá no Céu sorriem prazenteiros
São Roque e seus heroicos companheiros.
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