BICENTENÁRIO丨Fragmentos da Independência: a volta de D. João VI

Amanda Peruchi
Amanda Peruchi
Doutora em história e pesquisadora da história do Brasil do século XIX

O protagonismo do Brasil no Império português, oriundo sobretudo da sua elevação à condição de reino – como vimos no artigo anterior –, foi apenas uma das variadas causas que provocaram a revolução que rebentou em Portugal, em meados de 1820, e levou D. João VI das terras brasileiras. A ausência da corte, que há treze anos se conservava no Rio de Janeiro – e dali não parecia querer sair –, o dano sofrido pelo comércio português com a abertura dos portos brasileiros, em 1808, e a forte influência dos ingleses na administração militar portuguesa – o próprio exército português, desde a guerra napoleônica, era comandado pelo marechal britânico Beresford –, deram condições, entre outras mais, para que os portugueses buscassem alterar o cenário vigente.

Uma vez que estavam livres das tropas napoleônicas, pelas quais haviam sido pela primeira vez invadidos em novembro de 1807, os portugueses podiam agora se unir em prol de um novo objetivo: expulsar os britânicos do controle do exército português e promover a salvação da pátria. Nesse tempo, as ideias liberais igualmente se viam difundidas entre as monarquias europeias; defendia-se, por exemplo, que a Constituição era a única forma de assegurar os direitos e as liberdades individuais.

Daí, em nome da Constituição, da nação, do rei e da religião católica, um movimento militar foi iniciado no Porto em 24 de agosto de 1820, o qual rapidamente se espalhou para outras regiões portugueses. Em Lisboa, o movimento instaurou um regime interino, liderado por uma espécie de parlamento: as denominadas “Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa”. Entre as reivindicações dos membros desse movimento estavam o retorno imediato da corte e de D. João VI, como uma forma de restaurar a “dignidade” da antiga metrópole, e a retomada da exclusividade do comércio com o Brasil.

As exigências das “Cortes Gerais…” chegaram ao conhecimento de D. João VI em outubro de 1820. O monarca português, por sua vez, logo tratou de respondê-las, porém, nada do que ele dizia amenizava o ânimo de seus filhos abandonados do outro lado do Atlântico. Assim, em 26 de abril de 1821, D. João VI, acompanhado de aproximadamente quatro mil pessoas, partiu para a sua terra natal, onde desembarcou em julho.

No Brasil, a pedido do seu pai, Pedro de Alcântara e sua esposa, a arquiduquesa Maria Leopoldina da Áustria, ficaram para cuidar dos habitantes – eram fortes os rumores de uma possível revolta brasileira pelo retorno da corte. De ambos os lados, na verdade, o descontentamento era geral. Além disso, “o príncipe herdeiro, cheio de ardor político, andava de coração com os constitucionais, mesmo porque era a esse tempo D. Pedro português na alma, da mesma forma que Dom João VI se tornara brasileiro”, segundo anotou Oliveira Lima em seu O Movimento da Independência (1821-1822).

Após o regresso de D. João VI, o futuro de todo o Império se viu ameaçado. Por aqui, enquanto uns defendiam a manutenção da união com a antiga metrópole, outros, acostumados ao protagonismo no Império desde a transferência da corte portuguesa, argumentavam que a separação política era a única saída para os brasileiros.

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