SANQUIXOTENE DE LA PANÇA | A Eleição de Milei

Paulo Sanchotene
Paulo Sanchotene
Paulo Roberto Tellechea Sanchotene é mestre em Direito pela UFRGS e possui um M.A. em Política pela Catholic University of America. Escreveu e apresentou trabalhos no Brasil e no exterior, sobre os pensamentos de Eric Voegelin, Russell Kirk, e Platão, sobre a história política americana, e sobre direito internacional. É casado e pai de dois filhos. Atualmente, mora no interior do Rio Grande do Sul, na fronteira entre a civilização e a Argentina, onde administra a estância da família (Santo Antônio da Askatasuna).

“Como é bom ter presidente!” (Alguém, provavelmente)


Breves comentários para tentar explicar o que aconteceu na Argentina com a vitória do Milei.


Das 3 etapas das eleições argentinas, uma foi diferente das outras duas – justamente aquela que decidia mais coisas.

Tanto nas primárias quanto no segundo turno do pleito presidencial, a coalizão governista, chamada de Unión por La Patria (mas mais conhecida por Peronismo) “apanhou” nas urnas sem piedade. No primeiro turno, onde também se elegeram os membros do legislativo, o governo foi o grande vencedor.

Não estou insinuando qualquer esquema contra o Milei. Quem mais perdeu entre as primárias e as gerais foi a segunda força política – Juntos por el Cambio (ou Radicalismo). O Libertad Avanza de Milei fez votação semelhante às primárias. O Radicalismo, no entanto, apesar da queda substancial nas abstenções, perdeu votos entre agosto e outubro.

Aconteceu de o eleitor peronista resolver ir votar nas eleições gerais. E votou de novo no segundo turno. O candidato governista até fez votação parecida com a do primeiro turno. Porém, os demais votos migraram em peso para o oposicionista. Aí, foi covardia.

As eleições argentinas são feitas para que os resultados não gerem rupturas institucionais. A cada dois anos, renova-se metade da câmara dos deputados e um terço do Senado. Portanto, metade da câmara baixa foi eleita em 2021; e um terço da câmara alta foi eleita em 2019.

Portanto, ainda que não tivesse ocorrido a surpresa do ressurgimento peronista em outubro, mesmo assim Milei teria que enfrentar um Congresso eleito noutro momento político argentino.  O resultado de outubro apenas deixou tal tarefa ainda mais difícil.

Essa estrutura eleitoral argentina não é ruim. Pelo contrário, não é essa a causa dos problemas do país. Ela obriga o eleitor argentino a maturar suas vontades. As decisões perduram no tempo. É preciso dialogar com as decisões anteriores.

Claro, quando se chega na situação argentina, pode ser uma fonte pesada de dor-de-cabeça. Porém, é preciso encarar. Se o Milei estiver disposto, aí é uma questão de paciência.

Quanto a isso, é fato, Milei terá muito trabalho pela frente. O Radicalismo se dividiu em torno da questão de apoiá-lo. Ele sequer poderá contar que os legisladores radicais votem com o governo.

Porém, a proximidade dele com o Macri NÃO é acidental. Já vem de algum tempo, pelo que não surpreende o apoio da Bullrich assim que o resultado do primeiro turno saiu.

Buenas, para concluir, uma coisa é ganhar a eleição; outra é governar. Torço para o sucesso do Milei. O argentino é sofrido. É triste a situação dos vizinhos aqui. Espero que melhore. Contudo, não será da noite para o dia. Aguardemos.

Voltarei ao tema. Por ora, é preciso esperar.


NOTAS

RESULTADO

* Na Câmara:
– o Peronismo elegeu 58 novos deputados. Perdeu 11 cadeiras, mas segue a maior representação com 109 dos 257 representantes.
– o Radicalismo elegeu 31, ficando com 93 – 24 cadeiras a menos do que em 2021.
– o Liberalismo, chamemo-lo assim, elegeu 35, passando a ter 38 deputados.

* No Senado:
– o Peronismo elegeu 12 novos senadores, mantendo os 34 que tinha.
– o Radicalismo elegeu 2, ficando com 24 – 10 a menos do que em 2021.
– o Liberalismo, elegeu seus primeiros 8 senadores (dentre um total de 72).

As eleições argentinas começam com a P.A.S.O. (Primarias Abertas Simultaneas Obligatorias) que define os candidatos, tanto para o Executivo quanto para o Legislativo. O partido ou coalizão deve atingir um mínimo de votos. Se atingido, a lista mais votada o representa nas eleições gerais.

Nessa etapa, os peronistas ficaram em terceiro lugar pela primeira vez desde que o atual sistema foi adotado em 2011 (este foi 7º pleito). A vitória do Libertad Avanza foi igualmente novidade, pois a disputa sempre ficara entre as duas principais forças políticas do país.

Ademais, normalmente, as primarias são um indicador do que ocorre nas gerais um par de meses depois. Porém, nisso também este ano foi exceção.

Quando vieram as gerais, o governo saiu de primeiro para terceiro lugar.

O Unión por la Patria pulou de 6.719.042 votos em agosto para 9.645.983 votos em outubro.
O Libertad Avanza saiu de 7.352.244 para 7.884.336.
Já o Juntos por el Cambio viu seus 6.895.941 votos caírem para 6.267.152 votos.

Nas primárias, quase 750.000 votos foram para listas que não atingiram o mínimo. Nas gerais, houve pouco mais de 3.000.000 de eleitores a mais do que nas primarias. O Radicalismo perdeu próximo de 630.000 votos entre as etapas.

Houve, portanto, algo em torno de 4.400.000 novos votos nas eleições gerais. Desses, 2/3 migraram para o Peronismo. Isso ajudou a coalizão governista a manter-se como maior força no Congresso Nacional.

No segundo turno, o governo não conseguiu repetir o fenômeno. Dos votos dados no primeiro turno a outros candidatos, 75% foram para o Milei. Ao todo, Milei venceu em 10 das 13 provincias em que havia perdido para o Massa.

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