ENTREVISTA | Uma grande tradição do Nordeste

Leônidas Pellegrini
Leônidas Pellegrini
Professor, escritor e revisor.

Samuel Freitas fala sobre seu livro de estreia publicado pela Danúbio

Recentemente, a Editora Danúbio lançou no mercado editorial mais um autor da grande tradição literária do nosso Nordeste: Samuel Freitas. Ao lado de outros excelentes escritores nordestinos da Nova Literatura Brasileira publicados pela Danúbio, como Douglas Lobo, Milton Gustavo e Douglas Araújo, Samuel segue a boa linhagem de Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Jorge Amado, José de Alencar, Graciliano Ramos, João Ubaldo Ribeiro, Ferreira Gullar, Ariano Suassuna… Uma lista de grandes escritores da região parece não ter fim.

Em seu livro de estreia, a coletânea de contos O Jumento e o Carcará, Samuel apresenta ao público brasileiro uma voz inconfundível.  Suas narrativas são sempre permeadas de digressões perspicazes ou irônicas e farão o leitor culto ora re­fletir profundamente, ora comover-se, ora cair numa gargalhada repentina. Ao longo dos contos, o autor demonstra versatilidade e transita com segurança por diversos gêneros, a fábula, o conto filosófico, o conto religioso, a alegoria, a literatura fantástica, o realismo – e tudo isso é feito num saboroso cenário nordestino temperado com um humor de acento britânico muitas vezes inusitado e desconcertante. O resultado é uma das mais interessantes estreias literárias dos últimos anos no Brasil, inseridas na grande tradição nordestina.

Confira a seguir uma entrevista com Samuel Freitas, e espere muito mais desse grande escritor.


Revista Esmeril: Como você vê o atual cenário da literatura brasileira?

Samuel Freitas: Vejo um cenário descampado, estéril e desolador em sua maior parte. Não há possibilidade de qualquer cultura, no sentido etimológico e principalmente no campo da literatura, quando o solo é salgado por marqueteiros ideológicos, arado pelas mesmices nas narrativas, coberto pela supersaturação de pautas e literalidades de enredos.

Ainda bem que existem editoras como a Danúbio, onde o solo é mais propício para cultivar uma boa literatura.

Revista Esmeril: Fale sobre sua formação como escritor.

Samuel Freitas: Costumo dizer que “fui descoberto” escritor. Ao escrever mensagens para celebrar datas e comemorações, ou mesmo discursos para amigos e familiares, conseguia emocioná-los, e a outras pessoas.  Observaram que eu tinha, digamos, talento no trato com as palavras, e insistiram para que eu escrevesse um livro, mostrasse minha escrita ao mundo.

Sempre considerei que me superestimavam, que eu não daria conta, ou não faria algo de relevante, que prestasse. Bem, agora estou sendo publicado pela Editora Danúbio, prova evidente de que aqueles amigos e familiares podiam, afinal, estar certos.

Revista Esmeril: Como é seu processo de escrita?

Samuel Freitas: É uma gestação. Observo ao redor e fico atento a uma ideia ou a um tema que sejam válidos para serem transformados em uma história. Absorvo; deixo a paisagem afluir à imaginação. Logo em seguida, aparecem os personagens, as tramas, o enredo… Quando a gestação anuncia o parto, escolho o narrador que dará a melhor perspectiva e escreve se uma única vez, abrupto, numa tomada de fôlego.

Foi como dei à luz os contos que estão nessa coletânea publicada pela Danúbio. É uma técnica meio “intuitiva”, não tenho muito como explicar. Após “parido” o texto, é só limpar aqui e acolá, enxugar um tanto mais e entregar ao leitor.

Revista Esmeril: Quais são suas principais referências e influências?

Samuel Freitas: A primeira, sem dívidas, é Machado de Assis – mais pelo grande número de releituras que pela pretensão de espelhar seu estilo ou técnica. Tento trazer para minha escrita o filosófico, o mítico, o fantástico, o regional, o saudosismo, misturar traços populares com uma estética mais barroca. E cada uma dessas características é forte em determinados escritores.

Portanto, minhas referências são uma amálgama que deixarei para que os críticos descrevam com mais propriedade. Só busquei escrever cada conto de maneira com que o leitor refletisse sobre o que estava lendo, se divertisse, se angustiasse um pouco também, e tivesse a sensação de que a cada conto descobriria uma nova faceta do escritor.

Revista Esmeril: Como você define seu livro O jumento e o carcará?

Samuel Freitas: Em uma palavra: passamento. Os contos percorrem o desalento; aquela pontada no peito, de nostalgia; o desespero atenuado pela esperança; a saudade cicatrizada; o medo que sempre nos acompanhará; a hora do último adeus; a pequenez dos revolucionários; a terrível tragédia, filha do descaso com a indiferença; o salto de fé exigido quando parecemos abandonados; e o receio de tentar algo novo.

Não é um livro pesado, triste ou sombrio. Absolutamente, o contrário. O leitor irá se divertir, se emocionar e balançar a cabeça positivamente a cada conto lido. Porém, será aquela alegria soturna, contida, sabe? A mesma que observamos numa criança brincando e se divertindo sozinha, parafraseando Nietzsche.


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