PAULO SANCHOTENE | A Busca pelo ‘Brasil Profundo’

Paulo Sanchotene
Paulo Sanchotene
Paulo Roberto Tellechea Sanchotene é mestre em Direito pela UFRGS e possui um M.A. em Política pela Catholic University of America. Escreveu e apresentou trabalhos no Brasil e no exterior, sobre os pensamentos de Eric Voegelin, Russell Kirk, e Platão, sobre a história política americana, e sobre direito internacional. É casado e pai de dois filhos. Atualmente, mora no interior do Rio Grande do Sul, na fronteira entre a civilização e a Argentina, onde administra a estância da família (Santo Antônio da Askatasuna).

No começo do mês, houve a terceira edição do evento “Brasil Profundo: a redescoberta de quem somos”, realizado pelo Instituto Conservador Liberal; desta vez, em parceria com o Movimento Brasil Conservador. Depois de Várzea Grande (MT) e Londrina (PR), o evento ocorreu em Camaquã (RS), onde tive a honra de ser um dos palestrantes.

Para mim, trata-se de uma das discussões mais relevantes a acontecer no Brasil em muito tempo. Todavia, infelizmente, essa não vem recebendo a devida importância.

Eu poderia falar sobre o evento como um todo, mas como fui participante ativo, publico agora a minha apresentação. Abaixo, deixo os vídeos cobrindo a integralidade do evento.

INTRODUÇÃO

Basicamente, busquei falar sobre 4 pontos:

1. O ‘Brasil Profundo’;

2. Os seus cinco pilares (“Deus, Pátria, Família, Segurança, e Liberdade”);

3. O ‘senso comum brasileiro’ que os fundamenta; e

4. A ‘brasilidade’ – a base da comunidade política brasileira.

1. RESUMO DA APRESENTAÇÃO

Em resumo, o que falei foi o seguinte:

I. O Brasil passa por uma séria crise constitucional.

II. A cada crise, a pergunta que fazemos é: “que Brasil queremos ser?”

III. Esta pergunta é a causa da crise, mas seguimos cometendo o mesmo erro.

IV. A pergunta certa é “quem somos?”, pois só podemos almejar sermos a melhor versão de nós mesmos.

V. Para sair da crise, é preciso auto-aceitação; maturidade.

VI. Para sair da crise, devemos tentar reencontrar quem somos; redescobrir o ‘Brasil Profundo’ – entendendo por ‘Brasil Profundo’ uma expressão simbólica.

VII. A redescoberta do ‘Brasil Profundo’ é um constante exercício de tentativa e erro; sendo o evento um exemplo disso.

VIII. O ‘Brasil Profundo’ é um símbolo da essência, da auto-compreensão, dos valores, e da história do Brasil.

IX. O caminho para encontrar o ‘Brasil Profundo’ passa pela experiência de ‘ser brasileiro’.

X. ‘Ser brasileiro’ é aquilo que todos nós no Brasil temos em comum.

XI. O ‘Brasil Profundo’ existe dentro de cada um de nós brasileiros – sendo símbolo do ‘ser brasileiro’; do ‘Brasil-em-Nós’.

XII. O ‘Brasil Profundo’ é um símbolo do ‘senso comum brasileiro’; da ‘brasilidade’; daquilo que faz do Brasil, Brasil.

XIII. O ‘senso comum brasileiro’ é [a] comunitarista, [b] anti-dogmático, [c] ecumênico, [d] tolerante, [e] conservador, e [f] liberal.

XIV. A ‘brasilidade’ a tudo abraça e une sem vergonha e sem formalidades.

XV. É preciso aceitar o ‘Brasil Profundo’ como ele é, sem medo; pois o ‘Brasil Profundo’ sempre se impõe a qualquer sonho.

XVI. O ‘Brasil Profundo’ não tem lado (não é de Direita); estando acima da política de disputa do poder.

XVII. Precisamos estabelecer instituições que representem e promovam positivamente o espírito da ‘brasilidade’; no auxílio a nós brasileiros na tarefa de fazermos do Brasil e de nós mesmos os melhores possíveis.

2. OS CINCO PILARES DO BRASIL PROFUNDO

a. DEUS: porque o Estado é laico, e há coisas mais importantes que a política;

b. PÁTRIA: porque política se faz entre iguais e para o bem comum;

c. FAMÍLIA: porque é quem nos faz indivíduos e nos ensina comunidade;

d. SEGURANÇA: porque não há justiça nem aprimoramento duradouro no caos;

e. LIBERDADE: porque é dever de cada um fazer o bem.

Todos esses pilares se encontram manifestos no ‘senso comum brasileiro’ e são a base da ‘brasilidade’.

3. O SENSO COMUM BRASILEIRO

Estudo da Fundação Perseu Abramo publicado em março de 2017 trouxe à tona o senso comum brasileiro. O trabalho revelou que tal senso comum brasileiro tem uma clara noção de hierarquia de bens e valores.

O estudo traz onze pontos que seriam partes essenciais do senso comum brasileiro:

(I) ; [A salvação é individual; não é política; e é algo que compete a Deus. A política é importante; mas não, o mais importante. Política é suja e corrupta; é preciso que as pessoas sejam melhores para lidar com as tentações do poder. Religião é o que dá a direção para sermos pessoas melhores. Contudo, o estado deve ser laico para proteção da Igreja e dos fiéis.]

(II) território; [O lugar onde se nasce e se cresce é parte de quem somos. “De onde sou?” importa! Mesmo que a pessoa se mude, ela tem raízes.]

(III) bem comum; [A idéia de luta de classes é rejeitada. As classes sociais devem ser parceiras em torno dos interesses comuns.]

(IV) família; [Problemas sociais seriam decorrentes de problemas pessoais causados por lares desestruturados; um problema de formação. A pergunta fundamental é “quem sou?”. A família é onde aprendemos isso desde bebês. Se não há uma estrutura, as chances são de aprender errado; e corrigir depois é mais difícil.]

(V) pessoalidade; [A dignidade da pessoa humana é manifestada num “desejo de ser alguém”. Há uma rejeição ao identitarismo; à homogeneização, a ser tratado como “massa”. Porém, essas pessoas já são “alguém”; se desejam ser algo que já são, pode ser sinal de problema na nossa comunidade.]

(VI) ascensão social; [Há um desejo de melhora; de aprimoramento. Há um sentido de direção a paradigmas de excelência promovidos pelas elites sociais.]

(VII) perpetuação e moderação; [Por exemplo: educação e amizade (bens que ninguém tira) vêm antes de patrimônio (bem durável), que vem antes de consumo.]

(VIII) desconfiança de autoridade; [Só a posição de autoridade é insuficiente; é preciso demonstrar e convencer; portar-se como autoridade.]

(IX) tolerância; [Todo mundo tem defeitos; se algo faz bem, tudo bem; se torna a pessoa melhor e feliz, ninguém tem nada com isso. Há um dever de respeito mútuo. O que é secundário é irrelevante.]

(X) paz e ordem públicos. [Prefere-se a estabilidade ruim ao caos. Afinal, uma ascensão duradoura só é possível com segurança.]

4. BRASILIDADE

Quem tem senso comum, sabe; mas não sabe que sabe. Quem tem o senso comum brasileiro vive a brasilidade. Agora, não adianta apelar ao senso comum para quem não o tem. Estamos em crise! É preciso resgatá-lo. Para resgatá-lo, é preciso entendê-lo. Infelizmente, não tive tempo de entrar na questão da brasilidade. Contudo, publico aqui os pontos que gostaria de ter feito.

A cultura do Brasil é multicultural. É preciso olhar o Brasil sem medo da resposta; sem vergonha. O Brasil somos assim. No Brasil, o multiculturalismo funciona. Não é perfeito, obviamente, mas funciona melhor que em qualquer outro lugar. O Brasil é multicultural e liberal; mas também é conservador e cristão. Isso é fundamental.

Quando há direção, ser multicultural não é problema. É preciso ser um “e pluribus unum” (“de muitos, um”). Na Europa, o multiculturalismo não funciona, pois é um ‘múlti-cúlti de cada um no seu quadrado’; algo bem diferente do nosso. Trata-se de multiculturalismo sem o “unum”; que quer fazer ‘de muitos, muitos’. Esse é o problema.

Nos EUA, o multiculturalismo até funciona. Eles são, e se reconhecem como, um “e pluribus unum”. Lá, há integração. Contudo, essa é incompleta. Por exemplo, a ‘pluralidade una’ deles é comumente demarcada por hífens. Eles se referem a ítalo-americano; a cino-americano; a afro-americano; etc.

No Brasil, a diferença é que não há hífens. Aliás, sequer há alusão à brasilidade. Por aqui, nos referimos como ‘gringo’, ‘china’, ‘nêgo’, etc. No Brasil, o elemento comum não aparece, pois aqui não precisa. A ‘brasilidade’ abraça tudo sem hífens e sem formalidades. Se está aqui, é brasileiro. Apropriação cultural é parte do que somos.

A razão para essa característica nossa é a brasilidade ter como fundamento ‘abertura ao sexo’. Sexo é a base do nosso “e pluribus unum”. Sexo é o alicerce da nossa amizade política e a forma da nossa cultura comum.

Sexo é mais que mera relação física. Inclui relações intelectuais e espirituais. Sexo é cultura! Sexo é cultura, pois encontramos Deus no sexo – ato de pro-criação, de participação na Criação! Encontra-se Deus também nos inebriantes pequenos prazeres da carne. Afinal, Deus é Verdade e “in vino veritas” (“a verdade está no vinho”).

É por isso que nós brasileiro conseguimos transformar tudo em sexo. E, convenhamos, sexo é bom. Essa é chave. O senso comum brasileiro aponta para um ‘desapego’, de não se levar a vida tão a sério. Isso permite que a gente não se agarre a coisas, e se entregue o outro, e pegue do outro. Isso é sexo.

No sexo, despimo-nos de nossas coisas, apresentamo-nos substancialmente ao outro, e oferecemo-nos integralmente a ele. Sexo é um ato mútuo de entrega e geração; em que ‘dois’ se tornam ‘um’ e eventualmente formam um ‘terceiro’. A identidade dos dois agentes, porém, é preservada. É assim, através desse tipo de relação que o Brasil, de muitos, tornamo-nos ‘um’.

Historicamente culturas diversas interagem umas com as outras no Brasil como numa relação sexual. Por diversas razões, portugueses, índios, e africanos encontraram-se juntos no Brasil, e os dois principais elementos comuns entre eles eram o sexo e o Divino. A miscigenação e o multiculturalismo brasileiros começaram com os “acasalamentos” entre esses povos. Quem chegou depois entrou na festa.

O multiculturalismo falha onde ninguém quer se despir de nada. É multiculturalismo sem acasalamento: sem amor; sem amizade; sem paciência; sem um fim comum. É um multiculturalismo sem sexo nem Deus! Não há comunidade!

C.S. Lewis escreveu que o diabo pode até tirar proveito do prazer, mas nesse jogo é Deus quem está em casa! O multiculturalismo precisa ser entendido e vivido como ‘cultura’ – i.e., como culto a Deus ou, em linguagem secular, como um caminho ao Bem. Precisa ser entendido, como no Brasil – o ‘Império dos Pequenos Prazeres’ do mundo.

ENCERRAMENTO

Deixo este texto a cargo dos leitores. O vídeo do evento pode ser visto abaixo.
Aguardo os comentários a respeito. A busca pelo Brasil Profundo nunca acaba.


Vídeo 1:
https://www.youtube.com/watch?v=anmoTslDwwI

Vídeo 2:
https://www.youtube.com/watch?v=ywpzihtTsH8

Vídeo 3 (Minha apresentação):
https://www.youtube.com/watch?v=ywpzihtTsH8&t=11938s

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