VITOR MARCOLIN | ‘Mudam-se os tempos’

Vitor Marcolin
Vitor Marcolin
Ganhador do Prêmio de Incentivo à Publicação Literária -- Antologia 200 Anos de Independência (2022). Nesta coluna, caro leitor, você encontrará contos, crônicas, resenhas e ensaios sobre as minhas leituras da vida e de alguns livros. Escrevo sobre literatura, crítica literária, história e filosofia. Decidi, a fim de me diferenciar das outras colunas que pululam pelos rincões da Internet, ser sincero a ponto de escrever com o coração na mão. Acredito que a responsabilidade do Eu Substancial diante de Deus seja o norte do escritor sincero. Fiz desta realidade uma meta de vida. Convido-o a me acompanhar, sigamos juntos.

Depois de um dia de labuta, já em casa, ouço um estrondo: era um dos grossos volumes da enciclopédia de literatura que caíra. Ainda sonolento, apanho o livro com cuidado — é um exemplar raro — e, mecanicamente, abro-o numa página qualquer. O autor explicava Camões. “Por meio de exemplos, apresenta-se a inconstância como a essência da vida humana”. No centro da página amarelada, jazia o soneto:

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

muda-se o ser, muda-se a confiança;

todo o mundo é composto de mudança,

tomando sempre novas qualidades.

*

Continuamente vemos novidades,

diferentes em tudo da esperança;

do mal ficam as mágoas na lembrança,

e do bem — se algum houve —, as saudades.

*

O tempo cobre o chão de verde manto,

que já coberto foi de neve fria,

e enfim converte em choro o doce canto.

*

E, afora este mudar-se cada dia,

outra mudança faz de mor espanto:

que não se muda já como soía.

***

À guisa de explicação, dizia o explicador: “Assim, afirma-se a permanente instabilidade do mundo exterior e interior: ‘Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades‘. A partir daí, chega-se a uma generalização de tom filosófico: ‘todo o mundo é composto de mudança‘. O tom desiludido deste soneto vem do fato de que as mudanças — que poderiam anunciar melhores tempos — para o eu lírico associam-se a um entristecimento, pois convertem o canto em choro. Esta constatação amarga é reforçada, no último terceto, pela instabilidade do próprio ritmo — imprevisível — das transformações”. Assenti.


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