CRÔNICA | As torres

Vitor Marcolin
Vitor Marcolin
Ganhador do Prêmio de Incentivo à Publicação Literária -- Antologia 200 Anos de Independência (2022) --, Vitor já trabalhou na redação da Revista OESTE e, atualmente, também integra a equipe do site do Padre Paulo Ricardo. "Nesta coluna, caro leitor, você encontrará contos, crônicas, resenhas e ensaios sobre as minhas leituras da vida e de alguns livros. Escrevo sobre literatura, crítica literária, história e filosofia. Decidi, a fim de me diferenciar das outras colunas que pululam pelos rincões da Internet, ser sincero a ponto de escrever com o coração na mão. Acredito que a responsabilidade do Eu Substancial diante de Deus seja o norte do escritor sincero. Fiz desta realidade uma meta de vida. Convido-o a me acompanhar, sigamos juntos".

Meu 11 de setembro

Eu tinha 7 anos. Na manhã de 11 de setembro de 2001 estava sentado no tapete da sala da vó Arlinda, que para mim era tão grande quanto o mar. Quem visse de longe diria que o projeto era insignificante, brincadeira de criança, perda de tempo; mas para mim era um fascínio. Era hipnótico: dispor dezenas de fitas K7 em fileiras com o objetivo de, com a pontinha do indicador, desencadear aquele efeito dominó.

Os carretéis das fitas magnéticas guardavam, em imagens toscas e ziguezagueantes, momentos de importância permanente, como os registros do meu batizado. Na sala, as pessoas entretinham-se com qualquer coisa na tevê, só desviando a atenção da enorme Philco de tubo para me censurarem por causa do barulho. Mas para o menino o poder de provocar aquela queda sequencial, rítmica dos objetos era mais satisfatório do que qualquer coisa na tevê.

Tudo acontecia muito rápido. Era muito barulho por pouco. Com um toque, batizados, formaturas, aniversários, ceias de Natal, passeios ao zoológico, pescarias, missas e quermesses iam ao chão. Tudo planejado por mim. Subitamente, porém, quando eu principiara a restituir as fitas às suas posições de peças de dominó, ouvi um chamado proveniente da tevê que arrancou dos presentes exclamações pavorosas.

Era a jornalista que narrava, com ar de assombro, o que ouvíamos como “atentado terrorista às torres gêmeas em Nova York“. Os prédios tinham ido ao chão, desabaram, implodiram; os dedinhos que os empurraram foram dois enormes Boeings. Lembro ainda que só atinei para a significância do acontecido no momento em que ouvi, apreensivo, as exclamações daqueles que estavam sentados no sofá.

“Jeová!”, “O que é isso?!”, “É o fim do mundo!”, “Não é possível!”, “Foram os terroristas, os islâmicos!”… “É a Parusia!”. Parecia que o mundo chegara ao seu termo naquele início do século XXI. Voltei os olhos para o tapete e comecei a chorar: gritei impropérios malcriados contra um tio que chutara, sem querer, um dos objetos do meu projeto infantil.

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