“Não há no mundo Poder Judiciário mais forte que no Brasil”
Alexandre de Moraes
Apesar de discordar da afirmação, há sim judiciários mais fortes que o brasileiro – exclusivamente em ditaduras – o importante da frase é a convicção de quem a pronuncia. Uma afirmação dessa fora de qualquer contexto não causaria maior apreensão. E é justamente o contexto brasileiro que a torna tão apavorante.
Qualquer pessoa com o mínimo de conhecimento jurídico – ou com bom senso – tem assistido horrorizado o que o Judiciário, na figura de sua mais alta Corte, tem feito para a desestabilização jurídica e política no Brasil nos últimos seis anos. Gradualmente e em crescendo, o Supremo tem tomado as rédeas da vida pública e política de maneira nunca antes vista.
Em meu artigo inaugural nessa revista CESAR LIMA丨O STF e a invasão sobre os outros Poderes, expliquei como a tese da Constituição Viva – onde juízes adaptam a Constituição a anseios do momento, muitas vezes reinterpretando-a a seu bel prazer – estava causando sérios problemas na balança dos Poderes. Passado um ano e meio da publicação desse artigo a situação escalou até chegarmos nessa frase.
A tese da Constituição viva, apesar de horripilante, ainda era discutível em alguns aspectos. O grande problema é em que ela poderia transformar o Judiciário. Estamos vendo ao vivo as consequências da extrapolação dessa reinterpretação livre da Constituição pelos juízes.
Tivemos, em escalada, a proibição de nomeação de cargos de responsabilidade exclusiva do Executivo, censura de jornais e revistas, inquéritos sem fim ou objeto, prisões e diligências contra cidadãos sem justificativas legais, intervenções ilegais no Executivo e Legislativo, julgamentos de pessoas sem foro privilegiado, condenações sem provas e sem respeitar o devido processo legal.
E mais. Cassações de mandatos parlamentares e candidaturas, forte repressão de redes sociais, ações diretas contra estrangeiros e persecução penal contra residentes em outros países sem respeito aos acordos internacionais, a lista é imensa e, por si só, serve para demonstrar o total descolamento do Judiciário em relação à Constituição e às leis infraconstitucionais.
Mas o mais grave ainda estava por vir. Talvez não precisando mais aparentar legalidade, um ministro desengavetou uma antiga ação – protocolada por um partido de esquerda – e em um despacho liminar decretou inconstitucional a lei de impeachment, alterou quem a poderia propor contra ministros do Supremo e aumentou o quorum de senadores para acata-la.
Diante do escândalo, inclusive da mídia bem remunerada, voltou parcialmente atrás, mas o recado está claro, “não mexam com o Judiciário mais poderoso do mundo”. E o recado foi eficaz, enquanto se esperava uma resposta do Congresso, este capitulou de vez.
Primeiro começaram articulações para uma emenda constitucional que regulamente o impeachment. Até parece uma resposta à altura, mas se trata apenas de aceitar tal decisão arbitrária como válida, necessitando de outra lei para resolver a questão. Em seguida. Esse mesmo Congresso aprovou um projeto de “dosimetria” para os condenados pelo oito de janeiro de 2023, bem mais inócuo que o esperado e enterrando a anistia.
Hoje, no fechamento deste artigo, o ministro que disse a frase acima acabou por invalidar a decisão da Câmara dos Deputados que rejeitou a cassação do mandato de Carla Zambelli – a mais votada do Brasil – e determinou a convocação do suplente. É a desmoralização dos representantes eleitos no grau máximo, se isso ainda for possível.
Enquanto o debate político do momento é o lançamento de candidatos de oposição ao pleito de dois mil e vinte e seis, a pergunta que deixo é: esse Judiciário tão poderoso vai permitir que alguém seja eleito para enfrentá-lo ou vai fazer o que tem feito de melhor?



